João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

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PERDA DE IDENTIDADE

PERDA DE IDENTIDADE
 
Até há alguns atrás, uma cidade brasileira podia ser mapeada através de quatro equipamentos principais: o campo de futebol, a igreja, as Casas Pernambucanas e a Santa Casa de Misericórdia. A cidade que tivesse os quatro equipamentos podia ser considerada uma cidade boa. Hoje as cidades cresceram e perderam muito das identidades que as caracterizavam. Os campos de futebol desapareceram. Alguns viraram estádios e não sei dizer se isso é um progresso ou não. Os antigos moradores dos bairros do São João e do Shangai podem falar disso melhor que eu. Eu tenho muita saudade do “Maracanã dos pobres”, como era chamado o campo do São João, onde assistíamos aos clássicos da nossa várzea, empoleirados nos barrancos que cercavam o campo.
Quanto às Casas Pernambucanas, elas ainda existem, mas hoje são grandes magazines que não mais se distinguem das outras casas do mesmo gênero. Sucumbiram às necessidades impostas pelo mercado e penso que seus proprietários fizeram bem, pois quem não se adapta às regras desse tirânico senhor acaba sempre eliminado.
As igrejas também mudaram muito. Não falo da sua estrutura interna, que mal conheço, mas das suas estruturas externas, físicas, arquitetônicas. Antigamente, por causa das formas arquitetônicas peculiares, imponentes, no mais das vezes, a primeira coisa que se via quando chegávamos à uma cidade, era a igreja. Hoje não é mais assim. Simplificaram-se as construções, e as igrejas não apresentam mais aquela visão de grandiosidade e beleza plástica que apresentava em outros tempos. Os templos de todas as confissões hoje são muito parecidos, e se alguém diz que tal endereço fica perto da igreja, logo perguntamos: que igreja? A Católica, a Pentecostal, a Assembléia de Deus?
E quanto às Santas Casas? Sem dúvida a maioria delas também mudou. Em grande parte perderam identidade. Algumas fecharam suas portas, outras deixaram de ser filantrópicas, a grande maioria foi absorvida pelo Sistema Único de Saúde. E sobrevivem com muita dificuldade, como aquelas antigas e nobres famílias que perdem o viço econômico e a importância política e social, mas não a pose.
As mudanças ocorridas na estrutura social do país e as expectativas criadas pela Constituição de 1988, na área da saúde, com a organização do SUS- Sistema Único de Saúde-, obrigaram as Santas Casas a mudar o seu modo de ser e viver. De entidades filantrópicas, que se regiam unicamente pela regra básica do ensinamento cristão – dar de graça o que de graça recebiam- já que sobreviviam essencialmente da caridade dos cidadãos e do serviço voluntário, elas se viram obrigadas a assumir uma organização de empresa, prestadoras de serviços de saúde, submetidas às regras de mercado e a todas as vicissitudes e incertezas que se apresentam às empresas desse segmento econômico.
Ás que foram capazes de se adaptar a essa nova realidade sobreviveram. As que não conseguiram, sucumbiram. As Santas Casas que o Estado assumiu, por incorporação ou por intervenção, são as que hoje, apresentam as maiores dificuldades. É muito difícil adaptar as regras do serviço público a um mercado que se rege pela lei da oferta e da procura. As Santas Casas ainda são algumas das instituições que conseguem fazer isso com algum sucesso. Podemos dizer, sem nenhum constrangimento, que não existe, no país, instituição que consiga fazer saúde mais barata do que uma Santa Casa bem administrada. Aqui, no Estado de São Paulo, pelo menos, temos um governador que sabe dessa realidade. E, em razão disso, não tem poupado esforços para ajudar as Santas Casas a superarem seus déficits financeiros e aumentar a eficiência de suas gestões, oferecendo às suas diretorias, muitas vezes composta por pessoas leigas, a consultoria de renomados profissionais do ramo.      
É assim mesmo que tem que ser. Por isso saudamos com muita alegria e esperança a proposta de uma gestão compartilhada, na forma anunciada pelo prefeito Marco Bertaiolli. A Santa Casa de Mogi das Cruzes, desde 2003, quando aqui assumiu o Provedor Airton Nogueira, vem fazendo a sua lição de casa, procurando se adaptar aos novos rumos traçados pelas autoridades da saúde no país. Muitas conquistas foram feitas, mas ainda há muita gente que não sabe disso. Talvez por que nunca tenham precisado do serviço público, também nunca procuraram se informar a respeito, e pensam que a Santa Casa de Mogi das Cruzes ainda é aquela bagunça de seis anos atrás. Queremos compartilhar com toda a comunidade mogiana o trabalho que está sendo feito aqui. Por isso convidamos a todos que quiserem fazer parte do nosso voluntariado, ou da nossa irmandade, que venham somar esforços a nós. Serão todos muito bem-vindos. Não receberão nada por isso, mas voltarão para casa com o coração contente. E se hoje ainda tem gente que pergunta o que a Santa Casa faz das verbas públicas que recebe, quem sabe, depois de conhecer o serviço que ela presta á população mogiana, e participar dele, não mudem a pergunta e passem a indagar: como é que a Santa Casa consegue fazer o que faz com as verbas que recebe?

João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 07/08/2009


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