João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


                                 OS NOVE BILHÕES DE NOIME DE DEUS
“Semana após semana, a máquina tipo 5 modificada, cobrira milhares de folhetos de uma incrívrel algaravia. Paciente e inexorável, o computador reunira as letras do alfabeto tibetano em todas as combinações possíveis, esgotando série após série. Os monges recortavam certas palavras á saída da máquina de escrever elétrica e colavam-nas com devoção em enormes registros. Dentro de uma semana acabariam  (...)
─ Ouça Jorge ─ disse Chuck, vamos ter aborrecimentos.
─ A máquina escangalhou-se?                                                   
─ Não.
(...)
─ Acabo de descobrir o motivo da operação.
─ Mas já o sabíamos!
─ Sabíamos o que os monges queriam fazer, mas não sabíamos por quê.
─ Bah! São uns loucos...
─ Escuta Jorge. O velho acaba de explicar-me. Eles creem que assim que acabarem de escrever todos aqueles nomes (e segundo pensam são cerca de nove bilhões), o objetivo divino será atendido. “A raça humana terá atingido o objetivo para o qual foi criada.”   ─ Os Nove Bilhões de Nomes de Deus. Arthur Clark.                                     
              A tradição cabalística                                 
A Cabala, mística tradição religiosa dos judeus, é a fonte da inefabilidade do Nome Sagrado. Os cabalistas consideram o nome de Deus tão sagrado em sua grafia quanto impronunciável em sua verbalização.
Não há concordância quanto a origem dessa tradição, nem se registrou a sua história ao longo do tempo. É possível que ela tenha se originado do próprio texto do Decálogo, que em seu terceiro mandamento proibe que o nome de Deus seja pronunciado em vão. 
Todavia, o que se veta nesse preceito é o uso indiscriminado e vazio desse nome, como o próprio Jesus acusou os escribas de fariseus de fazê-lo. Assim, como já referido, em algum período pós-exílico, os judeus adotaram o termo Adhonái ao se referir á Deus Dessa forma, as iniciais YHWH, com que os hebreus grafavam o Nome Sagrado receberam sinais vocálicos, colocados pelos copistas do texto massorético, para que o Nome Sagrado fosse pronunciado Adonai, de forma que a verdadeira pronúncia fosse reservada somente aos iniciados na tradição judaica da Cabala.
A tradição cabalística veicula a crença de que a Toráh (a lei judaica contida nos cinco livros de Moisés) foi revelada a Moisés no alto do Monte Sinai, e ele teria registrado na forma escrita apenas aquilo que poderia ser repassado ao povo como ensinamento formal. Mas além desses testemunhos, Deus teria feito a Moisés outras revelações que ele não registrou, mas ministrou de forma oral aos seus sucessores. Uma dessas revela-ções foi o seu verdadeiro nome e a maneira de pronunciá-lo, pois segundo essa crença, esse nome é uma palavra de poder. Foi com ela, aliás, que Deus teria se manifestado no mundo da matéria e com ela tambem teria despertado o homem Adão para a vida.[1]
 A palavra sagrada, contida nas iniciais YHWH, denotaria assim a existência de uma relação mais profunda entre o "Senhor Deus" e sua obra e não poderia ser usada em vão, razão pela qual Moisés a transformou em um dos preceitos do Decálogo.
Para os cabalistas medievais essa tradição assumiu contornos místicos inimagináveis. Acreditava-se que a posse do segredo dessa pronúncia poderia conferir ao seu detentor um poder semelhante ao do Demiurgo Criador (conforme o conceito gnóstico-cabalíostico), ou seja, o poder de criar.
       Para eles, Deus tinha criado Adão recitando uma fórmula mágica, que resumia uma invocação á ação da energia dos princípios. Essa fórmula era o seu próprio Nome, pronunciado na sua forma original. Com base nessa crença uma seita judaica, a dos Hassidins, elaborou, no século XII, 221 combinações diferentes com as letras e os valores numéricos do alfabeto hebraico, e do resultado obtido chegaram á uma palavra – impronunciável para os não iniciados na Cabala  – que tinha o condão de animar uma figura de barro, dando-lhe vida. Aos seres criados através desse processo, os cabalistas chamavam de Golém.[2]
      Uma das primeiras referências a esse tema apareceu no século XV, conectadas ao nome do rabino Judá Loew Ben Betzalel, de Praga. Falava-se que esse rabino criara um Golém para defender o gueto de Josefov, em Praga, contra ataques anti-semitas. Com base nessa lenda vários trabalhos literários foram produzidos. Em 1847, uma coleção de contos judaicos intitulada Galerie der Sippurim, publicada em Praga por Wolf Pascheles, resumiu o conjunto de obras produzidas com essa tema.
    Na verdade, o Golem (גולם) é definido como sendo um ser animado que é feito de material de barro. O termo, no hebraico moderno, significa "tolo", "imbecil", ou "estúpido". Na tradição da alquimia o termo é conectado á palavra gelem (גלם), que quer dizer "matéria-prima”. Segundo algumas versões, o próprio Adão teria sido criado através dessa fórmula, pois segundo Gênesis 2:7, “o Senhor Deus formou o homem do barro da terra e inspirou em seu rosto um sopro de vida; e o homem tornou-se alma vivente.”
 
     Uma das mais interessantes derivações dessa tradição foi a crença de que as letras do nome de Deus representavam combinações que podiam ser usadas para interpretar os segredos que a Bíblia não revelava em sua forma escrita. É que no alfabeto hebraico, cada letra tem um determinado valor. Assim, combinando-se as letras com seus respectivos valores, era possível obter a interpretação oculta dos títulos, nomes, palavras e expressões usadas no livro sagrado, para encontrar seus verdadeiros significados. Assim, o Tetragrama YHWH correspondia ao número 26 ((Yode = 10, Hê = 5, Vau = 6, Hê = 5; 10 + 5 + 6 + 5 = 26). Essa técnica, conhecida como Gematria, tornou-se um dos mais importantes mecanismos de interpretação dos textos bíblicos, e ainda hoje é utilizado pelos cabalistas e pelos estudiosos da filosofia oculta para interpretar passagens obscuras e enigmáticas dos textos sagrados.    
 

               O Nome Inefável no Islamismo
 
      A crença islâmica não ficou isenta da tradição que atesta a multiplicidade dos nomes e atributos de Deus, conquanto ela assevere, com bastante ênfase, a sua unidade, negando inclusive a teologia cristã da Santíssima Trindade.  Nos termos do Alcorão, Alláh é o criador de todas as coisas, todo-poderoso, senhor e juiz de toda a criação, mas esse Nome também é apenas um nome e não exatamente o seu único Nome.
      Na verdade, o Islã não tem, como no judaísmo e no cristianismo, uma ideia definida do que Deus é, ou como Ele se apresenta aos olhos humanos. Ainda que lhes sejam proibido fazer uma imagem de Deus, no entanto, os judeus têm dele uma visão semelhante á do antigo patriarca do clã, que tinha poder de vida e morte sobre os membros do grupo. Essa ideia é bem visível na imagem veiculada pelos rabinos judeus para quem Deus é visto como “O Ancião dos Dias”, “O Vasto Semblante” e outras figuras semelhantes, denotando a vontade que eles têm de possuir uma informação visual a respeito, apesar da interdição bíblica sobre esse assunto. 
      Quanto á doutrina cristã, ela sugere a existência de uma relação pessoal entre o homem e Deus que pode ser realizada pela crença do sacrifício de Jesus, o qual criou uma ponte entre o divino e o profano, de tal sorte que quem se propuser a atravessar essa ponte ─ vivendo de acordo com credo cristão─ pode obter a salvação e até influenciar o próprio Deus para que este o ajude a realizar seus próprios destinos sobre a terra. Nesse sentido a imagem que os cristãos fazem de Deus é a de um pai benevolente e tolerante, que ama seus filhos acima de tudo e está sempre disposto a redimi-lo por pior que seja a sua conduta.
       Para os muçulmanos, todavia, essa concepção é mais difícil, pois ele não consegue substantivar o Nome Sagrado de forma a dar a Ele uma imagem visual. Todas as referências que ele tem a esse respeito são dadas em forma de adjetivos, pois no Islã Deus não tem imagens, mas apenas atributos. Assim se perguntarmos a um muçulmano quem é Allah, ou o que ele é, sempre obteremos respostas do tipo “Alláh é grande!” “ Allah é magnífico”, Alhah é único! E assim por diante.  Esta sentença adjetiva não significa apenas que Alláh é único, incomparável, onisciente, máximo e perfeito, mas principalmente que não há outro conceito de divindade que dispute com ele. Destarte ele é incognoscível e inatingível pela mente humana, por isso é impossível figurá-lo ou defini-lo, por mais portentosa que seja a nossa imaginação e a nossa sabedoria.
       O conceito de Deus, no Islã, não pode ser compreendido e nem definido pela mente humana. Ele está além dos nossos desejos e vontades. Não podemos influenciá-lo. Só podemos segui-lo e submetermo-nos á sua Vontade.  Pelo contrário, ele nos idealiza e nos determina que o sigamos. Ele não é um deus pessoal, faz o que quer conosco. Seduz a quem quer seduzir e desvia quem ele desviar, da mesma forma que exalta a quem escolher. (Suras al-Na’am 6:39; al-Ra’d 13:27; Ibrahim 14:4; al-Nahl 16:93; Fatir 35:8; al-Muddaththir 74:31).    
 
      Todavia, esse conceito abstrato e impessoal de Deus nem sempre agradou a todos os muçulmanos. Talvez por influência cristã ou mesmo judaica, há entre eles quem se pergunte o que, ou quem é Allah e o que ele realmente deseja que façamos. Assim, além dos 500 atributos e títulos de Alláh, que são nomeados no Alcorão, eles procuraram substantivar alguns, dando a cada um desses atributos um título pessoal, que na língua árabe designa um título de nobreza. Assim, segundo cada um dos atributos de Alláh, ele pode ser chamado pelos seguintes nomes que são listados na tabela abaixo|:     
Nomes de Alláh
Alláh Alláh
al-Rahman O Misericordioso
al-Rahim O Compassivo
al-Alim O Conhecedor (Onisciente?)
al-Hakim O Sábio
al-Ghafur O Perdoador
al-’Aziz O nobre Todo-Poderoso
al-Sami’a O Ouvinte (de todas as coisas)
al-Khabir O hábil
al-Qadir O Todo-Poderoso
al-Basir O Vidente
al-Waliy O Governador
al-Shahid O Testemunhador
al-Waliyy O Fiel Curador
al-Wahid O Único e Exclusivo
al-Ghaniyy O Rico
al-Hamid O Louvável
al-Wakil O Agente
al-Mu’id O Restaurador de tudo
al-Halim O amável Clemente
al-Qawiyy O Forte
 
     Os vinte nomes e títulos na lista acima correspondem a 84 por cento dos nomes e atributos de Alláh que aparecem no Alcorão, pois ali o total de atributos é de 99.  Um resumo dos nomes de Alláh pode ser encontrado na Sura al-Haschr 59:22-24.
                                   
           O Nome Sagrado na Tradição Maçônica
           
      Na tradição maçônica, a questão que envolve o Sagrado Nome de Deus é um tema de grande importância iniciática. De uma forma geral, os maçons adotaram a crença de que o verdadeiro significado desse Nome é um segredo guardado a sete chaves pelos Mestres da sabedoria arcana. Assim, os sons vocálicos originais do Tetragrama YHWH jamais serão conhecidos do vulgo, e a pronúncia correta dessa palavra está confinada á sabedoria de muitos poucos escolhidos. É um conceito semelhante ao adotado pelos cabalistas e diferente da crença islâmica, para a qual essa sabedoria está vedada para toda a raça humana.
Para os maçons, todavia, face á influência dos temas ligados á Geometria a questão que está ligada ao Verdadeiro Nome de Deus exprime as ideias que a Maçonaria tem de  tempo infinito, o espaço infinito, a vida infinita, enfim, todas as manifestações da essência divina na realidade universal, que são tanto adjetivas como substantivas. Explicando que nenhum dos nomes de Deus adotados pelo homem é considerado pela Ordem como certo e definitivo, o ritual sugere que o maçom apenas admita que Deus existe, mas não lhe dê nenhum nome nem tente conformá-lo á uma imagem, pois que esse conceito não pode ser reduzido á fórmulas que a mente humana pode desenvolver.
      Esse postulado sugere ainda que o espírito humano está ligado á essência primeira e única de todas as coisas e não necessita de quaisquer outros canais de ligação com a Divindade, a não ser a sua própria consciência e a sua sensibilidade.
     
 
[1] Teria sido também pelo poder dessa palavra que Moisés invocou as Dez Pragas que castigou o Egito e obrigou o faraó a libertar os hebreus.
[2]Essa palavra era grafada emeth, mas sua pronúncia correta era conhecida somente por poucos iniciados. Através dessa palavra, colada na testa da criatura e da pronúncia correta do Nome Sagrado, ela adquiria vida. Inicialmente o Golem foi criado para proteger o gueto judaico contra os ataques dos anti-semitas, mas logo o monstrengo saiu do controle do rabino e começou a matar gente inocente e provocar o terror no gueto. Ele então foi destruído através de outra fórmula cabalística que consistiu em tirar a primeira letra da palavra Emeth (Verdade), transformando-a em Meth, que quer dizer morto. 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 29/05/2015
Alterado em 31/05/2015


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