João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


CUMPRA-SE O DIREITO, DANE-SE A JUSTIÇA
                  
É engraçado como as coisas são. Qualquer estudante de direito aprende que Direito e Justiça são conceitos diferentes que devem ser estudados e considerados, cada um de per si. Justiça é um ser ontológico, um arquétipo, um “universal”, no dizer de Platão, um ser incorpóreo e sem forma definida. Já o Direito é uma fórmula desenvolvida pelas sociedades com a finalidade de garantir a realização e a execução da Justiça. O Direito nem sempre é sinônimo de Justiça, pois ele se ampara no devido processo legal, o qual pode ser manipulado, distorcido e até desprezado por quem tem o poder de julgar. Sem falar que ele nem sempre reflete a vontade e a necessidade de um povo, mas sim a vontade de quem está no poder e pode fazer as leis a seu bel prazer. Os decretos de um ditador não deixam de ser Direito, mas nem sempre correspondem á Justiça. Nem as sentenças compradas de um magistrado corrupto podem deixar de ser cumpridas quando não se conseguem reformá-las. Elas se tornam Direito. A Justiça é um conceito abstrato, o Direito é um conceito concreto.
Os advogados gostam de colar nos para-brisas de seus carros a frase: “sem advogado não se faz justiça.” Eles tem razão. Sem advogado não há justiça, até porque eles existem para mostrar a verdade que se esconde nos processos, mas nem sempre é tão evidente que salte aos olhos.
Mas o inverso também é verdadeiro. Será sempre um advogado que impedirá que seja feita a Justiça. Isso porque toda lide sempre tem duas pontas. Uma que acusa outra que defende. Uma que pleiteia outra que refuta. No fim ganha quem apresenta os melhores argumentos e quem sabe explorar, com mais competência, as nuances do devido processo legal.
Quando o caso excita as paixões públicas esse conflito entre Direito e Justiça fica ainda mais evidente. A opinião pública se pergunta, por exemplo, porque, até hoje, ninguém conseguiu meter na cadeia o notório assaltante dos cofres públicos chamado Paulo Maluff, ou porque nunca se fez antes uma operação tipo Lava a Jato neste país. Um país tão farto de escândalos de corrupção, em toda a sua história, que inclusive já levou até um presidente ao suicídio, já ter feito, há muito tempo, uma purgação dessas.
A diferença entre a quadrilha do PT e os assaltantes dos cofres públicos anteriores é que os “petelhos” se comportaram como amadores e foram com muita sede ao pote. Aproveitaram a facilidade com que se pode roubar os cofres públicos neste país e quiseram tirar tudo de uma vez. Mas o que fizeram não foi diferente do já se fazia antes deles. O que não os justifica nem diminui a culpa deles.
Mas o que causa perplexidade em tudo isso é o fato de a comunidade jurídica estar tão dividida em relação ao que está acontecendo. Que tanto jurista respeitado prefira ficar defendendo a forma ao invés do conteúdo. Ou, em outros termos, procurar, nas falhas do Direito escrito uma forma de obstruir a aplicação da Justiça.
Está certo. Advogado ganha a vida fazendo isso. Não importa se um bandido invade uma casa, rouba e mata seus moradores. Se ele for flagrado por uma câmara escondida e porventura a lei não admitir esse meio de prova  (a hipótese aqui é apenas exemplificativa), então o fato em si não terá existido. Se outras provas não houver que confirme a gravação, o bandido sairá impune.
Esse me parece o caso dos presentes "grampos" que a Policia Federal colocou no Lula. Os defensores do ex-presidente discutem a legalidade das provas, mas não o mérito do fato em si. Se as autoridades judiciárias decidirem que as gravações são ilegais então teremos que concordar que o Lula não disse o que disse, a Dilma não fez o que fez, e que tudo é uma grande farsa porque a forma não comporta o conteúdo. Cumpra-se o Direito, esqueça-se a Justiça.
É. Acho que temos que estudar um pouco mais a teoria da Gestalt. Talvez o mundo seja realmente uma grande ilusão formatada pelos nossos sentidos. Tudo o que vemos, escutamos e sentimos não são mais que meras ilusões produzidas pela nossa mente. Ela só vê o que quer ver, e o mundo é muito mais que a soma das suas partes. Nada do que estamos vendo é real. São apenas as imagens dos nossos desejos.
 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 20/03/2016
Alterado em 21/03/2016


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