João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

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 OS MAÇONS NA HISTÓRIA DO BRASIL 
 
  1. UMA IDEIA, UMA PRÁTICA, UMA INSTITUIÇÃO
 
 
Como todos os maçons sabem, a Maçonaria tem uma origem muito obscura. Nenhum historiador sério, até agora, ousou escrever uma história documentada da Ordem Maçônica, situando a sua origem, os seus verdadeiros antecedentes e sua razão de existir, seja na história do pensamento humano, ou mesmo como realização do engenho do homem na sua luta para organizar a vida social.
Como organização historicamente reconhecida, podemos situar seu nascimento nos idos de 1717, quando as quatro Lojas de Londres se uniram para criar a Grande Loja de Londres, a qual se tornaria o núcleo a partir qual a Maçonaria, como sociedade formalmente constituída, iria se tornar conhecida por todo o mundo ocidental. Mas, como diz a historiadora Frances Yates, antes dessa formalização como sociedade, a Maçonaria teve seus antecedentes históricos e filosóficos, os quais se perdem na noite dos tempos. [1]
      Aliás, se antes de 1717, já existiam Lojas maçônicas em toda Europa, especialmente na Inglaterra, Escócia, França e Alemanha, comprovadas por documentos preservados, é lícito observar que a atividade maçônica já era praticada e conhecida muito antes desses termos. Então, as datas de 1717 (união das Lojas londrinas) e 1723 (publicação das Constituições Maçônicas, de James de Anderson) são apenas elucidativas do ponto de vista histórico, como registro da existência de uma atividade que a sociedade humana já praticava desde as suas mais remotas origens.
    A Maçonaria é tão antiga como a própria sociedade humana. Mas só poderemos entender esse pressuposto se o colocarmos sobre um tríplice enfoque, que é a ideia, propriamente dita, que está na sua origem, a prática que ela originou, e a organização que lhe foi dada, para que ela adquirisse uma conformação e uma identidade na vida social das comunidades onde ela se instalou.
 
  1. A IDEIA
 
A ideia vem da necessidade que as sociedades têm de conservar as suas conquistas sociais. E para isso precisa congregar em círculos restritos as pessoas mais importantes, mais comprometidas e mais interessadas nessa preservação (poder intelectual, econômico, religioso e militar). Nasceram daí as instituições conhecidas como Mistérios, que por definição eram festivais folclóricos e religiosos que costumavam homenagear os deuses patronais dos antigos povos, para que estes os favorecessem com uma natureza propícia às suas atividades econômicas, sociais e de defesa. Esses festivais, que no início tinham finalidade essencialmente religiosa, assumiram, mais tarde, autênticas conotações políticas, pois se tornaram núcleos de distinção social. [2] 
 
  1. A PRÁTICA
 
A prática se encontra no núcleo da confraria, que por definição é uma a
ou conjunto de pessoas do mesmo ofício, da mesma categoria social, ou que praticam um mesmo modo de vida, ou pensam do mesmo modo, ou ainda comungam de objetivo comum. Confrarias existem desde que as primeiras civilizações adquiriram identidades próprias e se organizaram em estados, povos ou nações.
Entre os gregos antigos a noção de estabilidade social estava estreitamente ligada à idéia de Fraternidade. Os grupos familiares eram chamados de frátrias. Esses grupos congregavam as pessoas da família e todos os agregados que, de alguma forma, tivessem relação de parentesco com o chefe da família, ou qualquer ligação profissional, social ou legal, com o núcleo familial. Dessa conformação, em princípio moldada por vínculos de sangue e depois por interesses sociais, religiosos, políticos e econômicos, evoluiu a noção de clã ─ a família ampliada ─ e da reunião de clãs formou-se, mais tarde, a pólis, que era a comunidade circunscrita a uma urbe.
Foi esta última que deu origem às cidades-estado da Grécia antiga e da península itálica. Praticamente, todas as cidades do Ocidente clássico evoluíram a partir desses núcleos familiares. Iremos encontrá-los também em Roma, na estrutura do patriciado, assim chamados os núcleos familiares que deram origem ao estado romano e foram responsáveis por uma estrutura social que sobreviveu por muitos séculos.
Foram essas confrarias que origem às cidades-estado da Grécia antiga e da península itálica. Praticamente, todas as cidades do Ocidente clássico evoluíram a partir desses núcleos familiares. Iremos encontrá-los também em Roma, na estrutura do patriciado, assim chamados os clãs familiares que deram origem ao estado romano e foram responsáveis por uma estrutura social que sobreviveu por muitos séculos.[3] E depois, já na Roma imperial, urbanizada e organizada como um grande estado, iremos encontrar os Collegia Fabrorum, confraria dos profissionais de um mesmo oficio, os quais deram origem ás guildas corporativas da Idade Média e foram a origem dos modernos sindicatos.[4]
 
  1. A INSTITUIÇÃO
 
     Esta, como dissemos, nasceu em 1717, com a união das quatro Lojas maçônicas de Londres, e a Constituição dos franco-maçons escrita por James Anderson em 1723. Daí a Maçonaria espalhou-se pelo mundo como uma organização, em sistema de franquia, congregando diversos ritos e tradições, mas todas com um objetivo comum, que é a divulgação da ideia maçônica (preservação da ordem social) e a disseminação da sua prática doutrinária (através da formação de uma elite). Malgrado todos os esforços dos seus idealizadores, a Maçonaria nunca conseguiu escapar dos conflitos ideológicos que a sociedade humana sempre hospedou. Isso não tem sido diferente com a Maçonaria brasileira.
 
  1. ILUMINISMO X POSITIVISMO
 
   No campo das ideias é possivel perceber, desde logo, que a Maçonaria brasileira hospedou um conflito ideológico entre as ideias iluministas, inspiradas pela Revolução Francesa e as guerras de libertação das colônias americanas (especialmente as colônias inglesas) e o recente pensamento positivista que havia se instalado entre os intelectuais que inspiraram a organização da maioria dos governos das colônias emancipadas.
  O Iluminismo, como se sabe, é um movimento intelectual que surgiu no começo do século XVIII na Europa, defendendo o uso da razão e da ciência (luz) ao invés da fé e do direito imposto por quem detém o poder (trevas). Pregava a liberdade econômica, política e religiosa para todos.
   Já o positivismo defende a ideia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro. O positivismo afirma que só existe verdade quando ela é comprovada através de métodos científicos válidos.
   No fundo são dois movimentos que se completam. A única diferença é que o Iluminismo admite, ainda que sob certas condições, uma presença divina a orientar a razão humana, coisa que é negada veementemente pelos positivistas.  
   Esse conflito pode ser percebido na intenção de um grupo de irmãos que pugnavam por uma maçonaria não envolvida em questões políticas, mas inteiramente voltada para a filosofia, no sentido da preservar uma ética e uma moral que havia sido amplamente defendida pelos iluministas. Esse pensamento, como é óbvio, se identificava mais com as ideias reformistas dos protestantes, razão pela qual encontrou, desde logo, a oposição das figuras mais importantes da maçonaria brasileira, que eram todos católicos, e em muitos casos, ligados oficialmente á Igreja Romana.
    Haja vista que no século XIX havia um grande número de padres que eram maçons.    Ressalte-se que a Maçonaria, no Brasil, só passou a ser combatida oficialmente pela Igreja Católica depois da chamada Questão Religiosa, desencadeada por um discurso proferido pelo padre maçom José Luís de Almeida, em 2 de março de 1872, exaltando os maçons e a Maçonaria como principais responsáveis pelos movimentos que culminaram com a independência do Brasil, e pela luta pela abolição da escravatura. O Bispo do Rio de Janeiro, D. Pedro Maria de Lacerda, que reivindicava para a Igreja essas láureas, exigiu que o padre abandonasse a Maçonaria e mais tarde, com a evolução do conflito, isso iria resultar em uma proibição formal de que padres se tornassem maçons. Essa querela já havia sido desencadeada, entretanto, pelo Papa Pio XI, cujo ódio pela Maçonaria vinha do fato de que foram os maçons (especialmente Garibaldi, Mazzini e Cavour) que promoveram a unificação da Itália, que acabou com o poder político do Papa e reduziu o território da Igreja a um pequeno território, que é o Vaticano. [5]
    
  1. CONFLITO POLÍTICO: CONSERVADORES (MONARQUISTAS) X LIBERAIS (REPUBLICANOS)
 
     No terreno político a Maçonaria brasileira hospedou desde o início uma divergência política e ideológica que se revelou, ao longo do tempo, incontornável. Essa divergência começou entre os idealizadores da nossa independência, que se filiavam entre os monarquistas, chefiados pelo Grão-Mestre do GOB, José Bonifácio de Andrada e Silva e o republicano Gonçalves Ledo, que era o seu Primeiro Vigilante. José Bonifácio pugnava por um Brasil independente, mas não desligado politicamente de Portugal. Sua ideia era a do estabelecimento de uma comunidade luso-brasileiro, nos moldes do que viria ser mais tarde a Comunidade Britânica das Nações. Daí a sua luta para que a monarquia fosse preservada a todo custo. Já Gonçalves Ledo e seu grupo até aceitavam a monarquia em princípio, mas apenas como uma transição, para conquistar a independência, mas depois evoluir para a República, como nos demais países da América, que haviam se libertado de suas metrópoles.Filosoficamente o grupo de José Bonifácio adotava postulados iluministas, buscando uma compatibilização entre a ciência e a religião, enquanto os partidários de Gonçalves Ledo eram francamente positivistas e queriam um estado completamente apartado da religião. Esse, desde logo, foi um dos motivos de graves conflitos ideológicos na nascente Maçonaria brasileira, pois como se viu, havia em seus quadros um grande números de religiosos oficiais.
 
  1. EVOLUÇÃO POLÍTICO IDEOLÓGICO
 
     Essas tendências podem ser observadas em toda a história da Maçonaria brasileira desde então. Refletiria nos principais movimentos históricos que permearam a vida do Império e depois a da República. Movimentos liberais pela República, que geraram os mais importantes conflitos armados ocorridos no Brasil, como a Confederação do Equador e a Revolução Farroupilha foram liderados por maçons federalistas como Frei Caneca e Bento Gonçalves; o movimento abolicionista, igualmente de inspiração liberal e republicano também tiveram em maçons os seus principais líderes. Entre eles o Barão do Rio Branco, Luiz Gama, José do Patrocínio e o poeta Castro Alves. Do lado monarquista-conservador estavam também vários maçons, que lutavam pela preservação da monarquia. Entre eles grande nomes, como o Duque de Caxias (Grão-Mestre do GOB), o padre Diogo Antonio de Feijó, Joaquim Nabuco e outros maçons que escreveram importantes capítulos na história do Brasil.
   A tendência liberal republicana acabou triunfando com a Proclamação da República. Muito mais pelo enfraquecimento das lideranças monarquistas, que acabaram perdendo força com envelhecimento de D. Pedro II e a falta de um sucessor confiável para o trono e principalmente com a emancipação definitiva dos escravos, que destruiu, de vez, o modelo econômico vigorante no regime imperial. Mais uma vez, seria nas Lojas maçônicas que o movimento pela mudança do regime acabaria tomando corpo e seria, afinal, implementado. Esse movimento, que teria início na Convenção de Itu seria liderado por maçons e culminaria na proclamação da República pelo maçom Deodoro da Fonseca.[6]
   Embora a Maçonaria, a partir da implantação do regime republicano, e especialmente depois da ditadura Vargas, tenha diminuído sensivelmente a sua influência na história contemporânea do Brasil, ela ainda concentra uma importante parcela de poder na estrutura de governo do nosso país. É grande o número de maçons que militam no Executivo, Legislativo e Judiciário. A grande dificuldade é, hoje, como ontem, aglutinar todo esse poder em prol de um objetivo comum. Hoje, como ontem, as vaidades pessoais e a sede de poder falam mais alto e impedem a Maçonaria de alcançar plenamente seus objetivos, que é a realização de uma ordem social justa e perfeita.
 
[1] Francis Yates- Giordano Bruno e a Tradição Hermética- Cultrix, 1986
[2] Referência aos Mistérios Egípcios e os Mistérios de Elêusis, que muitos autores citam como legatários das mais antigas tradições maçônicas. Entre os iniciados nesses Mistérios eram encontradas as pessoas mais importantes dessas sociedades, que eram cooptados justamente pela importância (poder econômico, religioso, intelectual, militar) que adquiriam em suas vidas.
[3] Vide nossa obra “O Tesouro Arcano”, publicado pela  Editora Madras, 2012
[4] Especialmente as guildas dos construtores civis, chamados de pedreiros-livres, construtores de igrejas e mosteiros, chamados de franco-maçons, que estão na origem da Maçonaria histórica.
[5] Ver Castellani e Almeida- História do Grande Oriente do Brasil- Madras, 2009
[6] A Convenção de Itú, movimento republicana que deu o pontapé de início na proclamação da República, foi liderado pelo maçom João Tibiriçá Piratininga, que organizou o Partido Republicano
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 09/09/2017
Alterado em 10/09/2017


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