João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


RUI BARBOSA E A CABALA

 

Alguém poderá perguntar: porque a dor de uma ação negativa geralmente demora tanto para chegar ao seu autor, e, às vezes, nem chega? Não conhecemos pessoas egoístas, avarentas, malvadas, descrentes e até criminosas, que só vivem para si mesmas, e no entanto, terminam suas vidas sem conhecer dor e sofrimento?

A justiça existe? A doutrina da Cabala responde essa pergunta da seguinte maneira: se as consequências de um ato negativo repercutissem imediatamente à ação, não haveria, para o autor, a possibilidade da escolha. O livre arbítrio desapareceria do mundo. Todos saberíamos, imediatamente, qual o resultado das nossas ações e isso anularia toda ideia de progresso e aperfeiçoamento.

Por isso, no campo da espiritualidade, a resposta das nossas ações geralmente não é imediata. Pode levar várias vidas para ser dada, mas virá inexoravelmente. Ela apenas está oculta, no tempo e no espaço, aguardando uma interação de fatores, para acontecer na hora certa. Essa espera preserva o nosso livre arbítrio e fornece oportunidade para eliminarmos as “Qlippots” (cascas) que a nossa alma adquire por conta das besteiras que a gente faz na vida.

Isso vale tanto para o bem como para o mal que fazemos. Por isso temos a impressão de que não há justiça no mundo, porque, às vezes, pessoas que fazem o mal se dão bem e pessoas que fazem o bem se dão mal. Isso nos leva até a duvidar da presença de Deus no mundo. Justifica também o desconsolo do grande Rui Barbosa, expresso na famosa Oração aos Moços, quando diz que “De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça; de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto”.

Não é que a justiça não exista, diz a Cabala. É que ela depende das nossas  ações. Se todos fizéssemos as escolhas certas e só obrássemos para o bem, justiça, bondade, equidade, a felicidade enfim, habitariam para sempre no mundo, servindo a todos com igual dose de prazer.

A plenitude total estaria realizada. Mas isso seria o fim de tudo porque não haveria mais nada a fazer. O processo de aperfeiçoamento espiritual, pelo qual todos lutamos, estaria completo. E o conceito de eternidade perderia o sentido.

Rui Barbosa não era judeu. Portanto, dificilmente seria adepto da doutrina cabalista. Se fosse, certamente se recusaria a reencarnar neste nosso tempo, vendo o que os políticos fazem com o STF, tratando o nosso mais alto Tribunal como se ele fosse uma confraria de compadres, cujos membros são escolhidos para servir ao governo de plantão.

A Cabala é uma bela doutrina, vigorosa e consoladora, que ensina a ver o lado bom de todas as coisas. Mas que isso está difícil hoje em dia, está.  

 

João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 08/06/2023
Alterado em 09/06/2023


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