João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


Lux in tenebris lucet”.



Sinopse
Numa determinada cidade, um dia, o trânsito é subitamente interrompido.  Um motorista de origem japonesa, Yusuke, não consegue dirigir e diz que repente ficoucego. Ele é ajudado a chegar em casa por um homem, que depois, vendo que ele não podia identificá-lo acaba roubando o seu carro. No dia seguinte ele e a mulher vão consultar um oftalmologista, que não vê nada de errado com os olhos do japonês. Ele diz que uma "luz branca e movediça" está no lugar da sua visão. Algum tempo depois, todas as pessoas que tiveram contato com ele - sua esposa, o ladrão, o médico e os pacientes da sala de espera do consultório - também ficam cegas. A cidade toda fica cega. O governo trata a doença como uma epidemia e imediatamente coloca todo mundo de quarentena numa espécie de campo de concentração.  A mulher do oftalmologista é a única que não é afetada pela epidemia, mas vendo que essa condição poderia colocá-la e, perigo, finge estar também com a doença para acompanhar o marido em seu confinamento. Será ela que levará os cegos para fora do campo de concentração. Somente para descobrir que todos ficaram cego e o mundo se tornou um imenso caos."

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Certa vez uma grande escuridão caiu sobre uma cidade, obstruindo a luz e impedindo que as pessoas pudessem ver o que quer que fosse. Completamente cegos, as pessoas começaram a tropeçar umas nas outras, ferindo-se mutuamente. Sem poder guiar-se pela visão, as pessoas apelaram para os outros sentidos, guiando-se segundo os sons que ouviam, os aromas que inalavam, e escolhiam segundo o tato e paladar.
Sem poder ver o que tocavam e o que provavam, e sem poder identificar o que ouviam, começaram a provar de tudo, a pegar em todas as coisas que lhes caiam nas mãos, a repetir todos os sons que lhes chegavam aos ouvidos. O caos se instalou na cidade. As pessoas pegavam coisas que não eram delas, ingeriam alimentos que não lhes eram saudáveis, respondiam a todos os sons que ouviam, provocando na cidade um alarido ininteligível e ensurdecedor.
Logo começaram a se agredir umas às outras, pois onde quer que pretendessem ir, sempre esbarravam em algo, sempre havia alguém obstruindo o caminho. Logo começaram a se portar como animais, agindo por puro instinto e buscando unicamente a sobrevivência. Esqueceram-se de qualquer princípio humanitário. O mundo tornu-se um caos.
Foi então, que em meio à multidão ensandecida, alguém resolveu riscar um fósforo. Uma pequena luz clareou um ponto na imensidão sombria. Alguém aproveitou a pequena claridade e conseguiu acender uma vela. E logo, outra pessoa que estava dentro do círculo daquela luz tirou a camisa, enrolou-a em um pedaço de pau e fez uma tocha. Logo, centenas de tochas, fósforos, archotes e fogueiras brilharam em meio à impenetrável escuridão.
As pessoas olharam umas para as outras e reconheceram seus parentes, vizinhos e amigos. Mãos foram apertadas, abraços foram dados, e todos começaram a cantar e a dançar. A escuridão foi vencida e a paz voltou à reinar naquela cidade.
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Escrevi este conto como contraponto ao Ensaio Sobre a Cegueira do José Saramago. Não concordo com a ideia de que somos essencialmente maus e que é a visão do mundo cria a ilusão que nos mantém cordiais uns com os outros. Ao contrário, penso que a cegueira está na visão e não na ausência dela. Se deixássemos de enxergar somente o exterior das coisas talvez pudéssemos ser melhor do que somos. Cego não é aquele que não pode ver, mas aquele que vê o mundo a partir de uma única visão: a sua.
Agora, numa coisa ele está certo: caminhar dentro de si mesmo é mais difícil e inseguro do que caminhar fora de nós. O nosso mundo interior é escuro e desconhecido. Não há mapas seguros. Dentro dele podemos encontrar tanto a porta do céu quanto a do inferno. Saramago nos conduz á porta do inferno com seu Ensaio. Mostra o quanto somos maus quando não nos vemos uns aos outros. Mas essa visão é particular. Uma única pessoa que vê pode achar a porta certa e encaminhar por ela todos os outros. Não precisamos todos ser cegos tentando guiar outros cegos. E não precisamos sofrer por causa disso. A luz habita nas trevas, já dizia a velha sabedoria arcana. E quem não souber tirá-la das trevas, nela perecerá. Que Deus ilumine as nossas escolhas. Elas são as luzes que dão segurança aos nossos caminhos.
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Sobre o filme "Ensaio sobre a cegueira"- Flavio Meirelles.  
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João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 28/07/2010
Alterado em 28/07/2010


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