O TIRANO DA ALDEIA
“Lux in tenebri lucet”. *
Numa antiga aldeia medieval, situada no alto de uma colina, havia um castelo onde habitava um senhor feudal muito malvado. Seu principal divertimento era atormentar os pobres aldeões, seus servos, com castigos e trabalhos forçados, para que eles não tivessem forças nem coragem para se revoltar.
Não havia água na aldeia. O poço mais próximo ficava a mais de um quilômetro colina abaixo, de sorte que os pobres moradores do povoado, todo dia eram obrigados a descer com seus cântaros, para se prover do precioso líquido.
Um dia o senhor resolveu construir uma muralha de proteção para o seu castelo. Para isso convocou todos os cidadãos da aldeia e os fez trabalhar como escravos. Dois aldeões mais corajosos resolveram desafiar o malvado senhor. Recusaram-se a cumprir suas ordens e fizeram alguns discursos sediciosos, tentando sublevar a população. O senhor, depois de subjugá-los com a força dos seus soldados, impôs-lhes um cruel e aviltante castigo: um deles deveria transportar nas costas as pedras necessárias para a construção da muralha do castelo; o outro deveria, diariamente, prover os trabalhadores da necessária ração de água, transportando nas costas um pesado odre com água tirado do poço que ficava na aldeia, até o alto da colina, onde a muralha de proteção do castelo estava sendo construída.
Esse castigo só seria suspenso quando os muros ficassem prontos. Assim, os dois infelizes começaram a cumprir sua pena. Dia e noite, um transportando pedras, o outro carregando água.
Anos se passaram. Um dia, o malvado senhor percebeu que as muralhas logo ficariam prontas e ele teria que libertar os aldeões e perdoar os dois rebeldes. Isso era o ele que menos queria. Então imaginou um cruel estratagema: mandou que um soldado se postasse no alto da colina e toda vez que o prisioneiro chegasse com um carregamento de pedras, ele as empurrasse colina abaixo. E depois mandava, sob ameaça de morte, que o infeliz fosse buscar um novo carregamento.
Quanto ao que carregava água, o tirano mandou que fossem feitos pequenos furos no fundo dos odres, de tal sorte que o infeliz não os percebesse. Quando ele chegava ao alto da colina, praticamente toda a água carregada no odre havia se perdido pelo caminho. E assim ele tinha que voltar para pegar mais água.
Durante algum tempo os prisioneiros suportaram a terrível sina. Por fim, cansados de fazer aquele trabalho inútil, seus únicos desejos era acabar logo com aquela vida miserável para não precisar mais fazer aquele serviço sem finalidade. Ensimesmados em sua própria infelicidade, não perceberam que as pedras que eram roladas do monte foram recolhidas pelos aldeões que viviam no sopé do mesmo, e com elas eles haviam construído muitas casas novas, transformando a pequena aldeia numa florescente cidade. Quanto á água que se derramava dos odres, ela regava a terra, fertilizando-a. Logo, um belo jardim de flores silvestres se formou á beira do caminho e se espalhou por toda a colina.
A população cresceu e começou a se organizar. Chegou o dia em que os aldeões, agora cidadãos, decidiram se ver livres do malvado senhor do castelo. Então o atacaram e ele não pode se defender, pois não conseguira terminar a muralha de proteção, ocupado que estava em inventar maldades e aplicar castigos nos dois rebeldes. Seus soldados, enfraquecidos pela sede, preferiram se juntar aos atacantes logo na primeira investida.
O povo vitorioso carregou nas costas, em triunfo, os dois antigos prisioneiros morro acima, num cortejo pela alameda ornada de flores. E depois disso logo fundaram uma república.
Entre o grupo de notáveis que foi eleito para governar a cidade, os dois prisioneiros se tornaram as principais autoridades.
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* A luz brilha nas trevas
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 05/01/2011
Alterado em 05/01/2011