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CAPITULO VIIOS ARQUÉTIPOS HUMANOS
A questão bíblica da Criação
A Bíblia não é muito clara quando fala da criação do homem. Em Gênesis, 1:26 Deus diz: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança, e presida aos peixes do mar, às aves do céu, e aos animais selváticos e à toda terra, e a todos os répteis que se movem sobre a terra.” Desse estranho enunciado, extraímos logo que Deus não estava sozinho quando fez o homem, pois a sua locução foi registrada no plural (“façamos o homem”). E depois que o homem foi criado a partir de um modelo que já existia, ou seja, o próprio Deus e quem com Ele estivesse naquele momento. Até aí tudo bem. Podemos estar diante apenas de uma questão de linguagem. Pode ser que Deus estivesse falando consigo mesmo e se referisse no plural. Sendo Ele o ser plurimorfo, onividente e sempiterno que é, não haveria nada de estranho aí.
O problema vem depois quando a Bíblia trata da descendência de Adão. Ali se diz que seu primeiro filho foi Cain e o segundo Abel. Os dois entram em conflito e Cain mata a Abel. Deus não gosta nada dessa ação e coloca sobre a face de Cain uma marca, a marca do assassino. E Cain diz:” ;Eis que tu me expulsas desta terra, e eu me esconderei da tua face, e serei vagabundo e fugitivo sobre a terra; portanto, todo o que me achar, me matará.”[1]Ressalta, desde logo, que Cain e Abel não eram os únicos seres na terra além de seus pais Adão e Eva. Pois se fossem, quem seriam aqueles que achariam Cain e o matariam? E Deus confirma essa assertiva dizendo: “ Não será assim, mas qualquer que matar Cain será castigado sete vezes mais.(...) E Cain tendo se retirado da face do Senhor, andou errante sobre a terra, e habitou no país que está ao nascente do Éden.” [2] Logo adiante se diz que Cain conheceu sua mulher e com ela gerou um filho a quem chamou de Enoc. Mesmo considerando o que se diz em Genêsis, 5;4, que Adão viveu oitocentos anos e gerou filhos e filhas, de certo a mulher de Cain não podia ser sua irmã, pois Cain havia “ retirado da face do Senhor” e habitado num país ao nascente do Éden, longe portanto do local onde habitava sua primitiva família. Assim, pois, tudo está a indicar que a família de Adão não foi a primeira entre a espécie humana, e que quando Deus o fez “ sua imagem e semelhança”, outros seres humanos já existiam sobre a face da terra.
Temos duas teses a considerar sobre esse assunto. A primeira, antropológica, sugere que a criação do homem, conforme sugere a Bíblia, é uma metáfora que exprime o momento em o homem se destaca entre as espécies animais, adquirindo a capacidade de refletir. É o momento em que ele se torna humano. Por isso se diz que o Senhor Deus o “formou do barro da terra e inspirou no seu rosto um sopro de vida.” A outra tese, defendida por correntes místicas da Cabala e da Teosofia sustentam que o homem não foi feito pelas mãos de Deus, mas sim pelos seus dignatários angélicos, os Elhoins. Por isso a expressão no plural “façamos o homem à nossa imagem e semelhança”. Esta é uma idéia que estaria consentânea com a própria crença dos rabinos de Israel, produtores da Bíblia, pois um dos pressupostos fundamentais da sua religião é que Deus não tem forma nem nome conhecido pelos homens, razão pela qual nenhuma imagem sua poderia ser reproduzida. Destarte, dizer que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus, constitui, pois, uma grande incoerência que os sábios de Israel jamais cometeriam. [3]
O homem primordial
De acordo com uma sabedoria muito antiga, houve um homem primordial que teria vivido na terra antes da atual forma civilizada do ser humano. Esses homens formavam uma civilização cuja sabedoria era diferente da nossa e viviam vidas muito longas. Isso era possível porque eles conviviam em um mundo perfeito, de paz, saúde e felicidade, já que haviam aprendido a manter uma relação de amor e respeito para com a natureza do cosmo e com seu Criador, que é o Grande Arquiteto do Universo. [4] A Bíblia cita os primeiros patriarcas antediluvianos como sendo seres que viviam centenas de anos. No caso bíblico trata-se, evidentemente, de uma memória dessa civilização, porquanto o homem primordial de que se trata aqui viveu antes da chamada queda do homem, referida na Bíblia como a expulsão de Adão e Eva do paraíso. Entre os devas, seita gnóstica que sobrevive nas montanhas do Irã, ainda se conserva uma tradição segundo a qual antes de Adão ter sido formado, havia na terra duas raças, Os Devs, que reinaram durante sete mil anos e os Izeds, que reinaram durante dois mil anos. Os primeiros são identificados na Bíblia como os audazes nefilins, filhos de deuses com as filhas dos homens e os segundos são os gigantes que ainda nos tempos bíblicos eram encontrados na Palestina.[5] Os grandes heróis arquetípicos de todas as culturas, tais como Osíris, Gilgamés, Hércules e os míticos heróis da Bhagavad Gita também constituem memórias desses nossos predecessores.
O Homem Vitruviano
A doutrina que fala desses mundos anteriores e desse homem primordial é o objeto da Teosofia, disciplina que trata das antigas tradições religiosas, folclóricas e culturais dos povos antediluvianos e dos legados que eles nos deixaram. O homem primordial, ou homem da terra, feito à semelhança do homem do céu, é um arquétipo existente em praticamente todas as culturas antigas. Ele é aqui reproduzido no “Homem Vitruviano” mística concepção do arquiteto italiano Cláudio Vitrúvio. Ela mostra as proporções do corpo humano relacionando-o às medidas do universo. Pelo estudo feito por Vitrúvio, todas as partes do corpo humano estão em relação geométrica como o seu todo, isto é, braços e pernas são uma medida exata do tronco, pés e mãos também mantém uma exata proporção com o tronco e todas as demais medidas do corpo mano expressam essa relação. A idéia do“homem vitruviano” também guarda uma analogia bastante próxima com o “homem universal” da doutrina teosófica e da tradição cabalística.[6] Sua inspiração também pode ser buscada nos heróis arque-típicos da mitologia grega, que possuiam físicos perfeitos. O famoso desenho do homem vitruviano, acima reproduzido, é de Leonardo da Vinci. Nesse desenho é possivel perceber as seguintes relações:
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A distância do começo do cabelo para o topo do peito pode ser calculado como um sétimo da altura.
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A distância do topo da cabeça para os mamilos equi-vale a um quarto da altura e a largura máxima dos om-bros é igual a um quarto da altura ; a distância do co-tovelo para o fim da mão também é um quarto da altura e distância do cotovelo para a axila equivale um oitavo da altura de um homem;
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O comprimento da mão é um décimo da altura de um homem e distância do fundo do queixo para o nariz é um terço da longitude da face;
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A distância do início do cabelo para as sombrancelhas é um terço da longitude da face e a altura da orelha também é um terço dessa medida.
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Um palmo equivale ao cumprimento dos pés;
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A planta do pé tem a largura de quatro dedos;
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Um antebraço ou cúbito, é igual ao cumprimento de um palmo ou um pé;
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Um passo equivale a quatro antebraços;
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A longitude dos braços estendidos de um homem é a medida da sua altura;
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A distância entre o começo do cabelo e a ponta do queixo é igual um décimo da altura de um homem.
Esses medidas podem ser considerados como padõres para a raça humana e o desenvolvimento do corpo humano seguria essas proporções, excetuando-se, evidentemente aqueles organismos que, por uma doença qualquer, uma falha na conformação biológica ou mesmo um acidente de ambiente force a quebra desse padrão. Assim, a existência de pessoas cujos membros são desproporcionais ao resto do seu corpo, ou ou mesmo desproporção em qulquer outo membro, constitui exceção á essa regra, mas não a invalida. O propósito de Vitrúvio ao elaborar esse desenho era mostrar a relação matemática existente entre as proporções do homem com o universo, comprovando a tese de que o homem teria sido feito á imagem e semelhança do Homem do Céu, também chamado de Adão Kadmon na Cabala. Ele partiu do princípio de que o cosmo nada mais era que a reprodução do corpo do seu Criador. Essa relação de simetria, segundo ele, podia ser comprovada através da geometria do corpo humano. Note-se que a área total do círculo onde a figura está inscrita é idêntica á área total do quadrado. Dele se pode extrair o número mágico pi (π= 3.1415927) que os antigos matemáticos diziam ser o algoritmo fundamental para o cálculo de qualquer medida do universo. Como a maçonaria é a Arte (arquitetura) de construir, tanto o universo material quanto o universo espiritual, sendo aquela simbolizada pela sociedade perfeita e este pelo homem de cárater íntegro, nada melhor que o símbolo do homem universal (representado pelo homem vitruviano) para visualizar essa relação.
Por fim, é importante não esquecer que tanto Vitrúvio quanto Leornardo da Vinci eram tidos como simpatizantes das idéias rosa-crucianas. Leonardo da Vinci, inclusive, foi um dos nomes relacionados na lista dos Grão-Mestres do Priorado de Sion, suposta Fraternidade fundada no tempo das Cruzadas para conservar e proteger o segredo do Graal, no caso, a legitima descendência de Jesus com Maria Madalena e consta que teria participado da fundação de uma Academia de estudos clássicos em Milão, juntamente com Américo Vespúcio, Paulo Toscanelli e outros.[7]
O homem de Vênus
É interessante também registrar que essas relações já eram conhecidas nas antigas tradições egípcias como o homem venuziano (o homem de Vênus). Ele era representado nas lendas egípcias pelo hieróglifo que designa a estrela de cinco pontas, conhecida como Spa ou Shá. Essa estrela, como veremos, representa o símbolo máximo do segredo maçônico, ou seja, a Estrela Flamejante, ou o G fundamental, de onde o universo foi gerado.[8]
Note-se que o desenho do homem venuziano, conforme representado acima, corresponde exatamente à uma estrela de cinco pontas, inscrita dentro de um duplo círculo dividido em cinco segmentos de iguais proporções. Eles são perfeitamente simétricos simbolizando as propriedades fundamentais da criação. Representa o microcosmo refletindo o macrocosmo, ou, co-mo ensina a Cabala, o microprosopo (arquétipo humano) como reflexo do macroprosopo (arquétipo divino) mostrando a estreita relação entre todas as realidades universais. Com base nesses arquétipos de compartilhamento coletivo a maçonaria construiu sua base espiritualista. A partir deles se criou a vasta simbologia e a vigorosa mitologia sobre a qual a ela assenta seus ensinamentos, como veremos nos capítulos seguintes.
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do livro O Segredo Arcano, no prelo.
[1] Gênesis, 4,14
[2] Idem, 4;16
[3] Sobre esse assunto ver a nossa obra “Mestres do Universo”, Ed. Biblioteca 24x7, São Paulo, 2010.
[4] A Doutrina Secreta, op citado, pg.181 e ss
[5].Ibidem, pg. 196 e ss. O mito sobre o gigantismo das raças pré-adâmicas aparece em todas as culturas antigas, desde a Mesopotâmea até o Perú, onde existem lendas a respeito da cidade de Tihunaco, a qual teria sido construída por uma raça de gigantes. No Tibete também se cultiva essa tradição. A esse respeito veja-se Lobsang Rampa, A Terceira Visão, Ed. Pensamento, 1984
[6] Para a Cabala, o homem foi feito à imagem e semelhança, não de Deus, pois Deus não tem forma, mas sim de um arquétipo celeste chamado Adão Kadmon, que é uma representação da Árvore da Vida da Cabala. Esta, por sua vez, é uma replica do próprio cosmo em sua conformação física. Esse modelo seria também o retrato corporificado dos anjos (elohins), razão pela qual, em Gênesis 1;26 se diz, no plural: “façamos o homem à nossa imagem e semelhança”, como so Criador estivesse falando com alguém mais.
[7] Sobre esse assunto veja-se a obra de Baigent, Leigh e Lincoln, The Holly Blood and The Holy Grail, já citada. Veja-se também o capítulo ...desta obra. Sobre a chamada Academia de Milão, veja-se a pg. 86 desta obra.
[8] Sobre o significado da estrela na Maçonaria veja-se o capítulo XXIV da nossa obra “Mestres do Universo”, já citado.
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 02/04/2012
Alterado em 03/04/2012
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