João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


 
Capítulo X- OS PRISIONEROS DE CHINON
 
    Entre os setenta e dois Templários prisioneiros, que Filipe havia enviado ao Papa, a maioria era composta de membros expulsos da Ordem, que os senescais do rei haviam arreba-nhado por todo o território francês e colocado nas masmorras. Alguns eram, na verdade, espiões que o próprio Guilherme de Nogaret havia colocado dentro da Ordem para levantar informações sobre os supostos segredos dos Templários. Nem todos eram cavaleiros.
    O Papa estava numa encruzilhada. Se atendesse os desígnios do rei teria que sacrificar os Templários. Se não atendesse, poderia ter o destino de Bonifácio VIII. Prisioneiro do rei ele já era. Havia sido confinado no castelo episcopal de Poitiers, com uma tropa de arqueiros a guardá-lo.
    É com um semblante de resignada concordância que ele se apresenta no consistório reunido por Filipe em 29 de maio de 1308, para ouvir novas invectivas contra o Templários e contra a sua própria recalcitrância em agir contra eles. Gulherme de Plaisians, também conhecido como Guilherme de Paris, porta voz de Filipe, abre o coro de acusações contra o clero.
 
   – Os bispos que foram mandados por Vossa Santidade, para ouvir os Templários, os incitaram a negar as confissões que já haviam feito – disse ele. – O rei – acrescenta ele – publicará os nomes de todos aqueles que estão conspirando para que esses crimes não sejam devidamente punidos. O povo o exige e a assembléia dos Estados Gerais assim o decidiu.
Como se o Papa permanecesse calado, ele prosseguiu.
     – Existe a suspeita de que Vossa Santidade quer favorecer os Templários. Eles mesmos tem se gabado disso, dizendo que o Santo Papa não permitirá que nenhum mal lh es seja feito. Por causa disso, ação do rei está sendo posta em dúvida pela inércia de Vossa Santidade. – Assim – prossegue o porta voz do rei, implacável. – Vossa Santidade deve agir rapidamente para sanar os males que semeastes com vossas dúvidas, provando que tendes, realmente inclinação para o que é justo e para o bem.
  
     E Guilherme de Plaisians termina seu discurso perante o atabalhoado e desconsolado Papa.
 
     – A realidade dos crimes cometidos pelos Templários está mais que provada. Não se pode permitir que a pronta administração da justiça, num caso como esse, em que a fé cristã, e própria Igreja estão sendo ameaçadas, seja impedida. A forma legal de um processo como esse foi cumprida. Não podemos, agora, por conta de um problema secundário (Guilherme estava se referindo ao fato de o processo ser desencadeado pelo rei e não pela Igreja), deixar de aplicar o que é justo.
    O Papa dá sinais de que pretende falar alguma coisa. Gulilherme não dá aparte. Talvez adivinhasse que o Santo Padre iria objetar quanto á forma como o inquérito tinha sido conduzido e as condições em que as confissões foram obtidas.
     – Não devemos nos inquietar em saber como e por quem os crimes dos Templários foram revelados – disse Guilherme. – mesmo que essas informações tenham sido trazidas por pessoas leigas, se elas foram confirmadas perante os inquisidores ou seus prelados. A defesa da é uma prerrogativa de todos...
 
    Não pode haver recado mais claro. Clemente V sabe que não vai adiantar dizer que as confissões foram extraídas sob tortura e confirmadas por pessoas que foram expulsas da Ordem por comportamento vicioso. Essas pessoas certamente tinham um desejo de vingança e o estavam expressando nesse caso. O Papa compreende que Filipe não estava precisando da sua anuência para dar o desfecho que quisesse a esse caso. Faria o que bem entendesse com a sua concordância ou sem ela. Conclui que nada teria a ganhar se opondo ao rei. Aliás, poderia perder tudo se o fizesse.
   Foi então que decidiu colaborar. O consistório do dia vinte e nove de maio de 1308 marca a mudança definitiva do ânimo de Clemente V no caso dos Templários. A partir de então faria tudo como Filipe queria.
    Mas quer conservar uma aparência de legalidade e justiça no processo. Isso poderá acalmar sua consciência e calar vozes discordantes, quem ele sabe que serão levantadas. Manda chamar á sua presença os agora setenta e um Templários que foram postos sob a guarda da Igreja. Oliver de Penne, o preceptor da Lombardia, que havia sido mantido pelo Papa em prisão domiciliar em Poitiers, havia se evadido. Uma recompensa de 10.000 foi oferecida pela sua cabeça, mas ninguém conseguiu descobrir onde ele se escondeu.
    Clemente sabe que a maioria consiste de renegados da Ordem, ou que estão mancomunados com Guilherme de Nogaret para condenar os Templários. Todos confirmam as confissões anteriormente feitas aos inquisidores.
   Clemente mostra uma certa consternação e finge estar, de fato, convencido e indignado pela confirmação de crimes horríveis, cometidos por cavaleiros tão estimados e respeitados pela cristandade, de tal forma que a Igreja lhes havia outorgado tamanho poder. Manda emitir imediatamente a bula Faciens Misericordiam, na qual oficializa a abertura do processo contra a Ordem do Templo e dá completos poderes aos inquisidores para extrair dos Irmãos as confissões necessárias.
  Agora sim, os Templários poderão ser perseguidos, presos e inquiridos em todos os reinos da cristandade. O rei que não o fizer, ou contestar a autoridade Papal poderá sofrer as consequências. Filipe o Belo, finalmente triunfara em todos os sentidos.
  
   Para o rei, o caso já estava decidido. Mas para manter a aparência de legalidade, ele não se importa que o Papa se reserve o direito, de ele mesmo, julgar os grandes dignatários da Ordem, em especial o Grão-Mestre Jacques de Molay. Oficialmente, ele designa os bispos de cada diocese para chefiar o interrogatório dos membros da Ordem presos em cada uma de suas jurisdições. Define que os inquéritos deverão ser assistidos por membros das Ordens franciscanas e dominicanas e julgados por um conselho provincial de bispos.
    Como reservara para si o direito de inquirir e julgar os principais comandandes da Ordem, Clemente pede a Filipe que made os prisioneiros para Poitiers, onde ele se enconntra. O Papa está, nesse momento, preparando sua mudança para Avignon, onde a sede do Papado se instalará pelos próximos setenta anos, dando inicio ao chamado “Cativeiro da Babilônia” para os Papas.
    Não se sabe porque cargas d’agua os prisioneiros, ao invés de serem conduzidos á Poitiers, onde os Papa os esperava para ouvi-los pessoalmente, são levados á Chinon. Ali são encerrados na masmorra do soturno castelo daquela aldeia. Tudo leva a crer que foram ordens do próprio Filipe para que eles nunca se encontrassem com o Papa. Assim, eles jamais chegariam a Poitiers. Ficariam encarcerados em Chinon e dali só sairiam seis anos depois,  para serem levados á Ile de Lá Cité, onde Jacques de Molay e Geoffroy de Charney seriam queimados, no dia 18 de março de 1314. Os outros dois grandes dignatários, Hugo de Pairaud e Geoffroy de Gonneville morreriam na prisão.
   Dessa forma, Clemente V jamais se poria cara a cara com Jacques de Molay. Não podendo ir a Chinon para ouvir, ele mesmo os prisioneiros, designa três cardeais, Berénger Fredol, Estevão de Suisy e Landolphe Brancaccio para fazer o interrogatório. Os dois primeiros já haviam ouvido anteriormente os quatro prisioneiros. Nessa ocasião eles haviam feito a retratação do que haviam confessado perante Guilherme de Paris.     
   Mas agora, as coisas haviam mudado. 
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Da obra "Filhos da Viúva",  Conspiração dos Templários", título provisório, no prelo,


 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 21/10/2013
Alterado em 16/11/2013


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