João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


MORRER DE SEDE OU AFOGADO?

Você que é paulistano, mineiro ou carioca tem essa opção. Quer morrer de sede ou afogado em água suja? Pois é o que está acontecendo. De um lado torneiras secas, de outro, enchentes que destroem propriedades e levam pessoas ao desespero. É nessas horas que a gente fica pensando para que serve o engenho humano. Os maçons dizem que Deus deu inteligência aos homens para que eles botassem ordem no caos. “Ordo ab Chaos”. Mas ao que parece o que estamos fazendo é completamente o contrário. Estamos botando mais caos no caos inicial, que na verdade, não era caos, mas ordem. Deus nos deu as florestas para que elas filtrassem os gases venenosos da atmosfera terrestre e nos devolvesse oxigênio puro para a saúde do nosso sangue. Nós cortamos as florestas e jogamos cada vez mais gases venenosos na atmosfera. Depois tentamos corrigir o desequilibrio causado com florestas transgênicas que desequilibram ainda mais o ambiente. Deus nos deu os rios, com águas limpas e cristalinas que saem de suas fontes, para que nelas os peixes crescessem e se multiplicassem e servissem de alimento para nós; e para que pudéssemos ter boa água para sustentar o nosso organismo que é feito por três quartos dela. E o que nós fazemos? Jogamos todas as nossas porcarias nos rios, transformando-os em verdadeiros esgotos a céu aberto. Depois tentamos consertar isso fazendo reservatórios que modificam as condições ambientais e criamos peixes em cativeiros. Deus nos deu a camada de ozônio para que ela servisse de filtro solar, nos protegendo dos perigosos raios violetas, responsáveis por inúmeras doenças de pela. Nós destruímos a camada de ozônio com queimadas, gases tóxicos e sujeira de todo tipo, produzida em nome da economia e do chamado mercado de consumo, que parece ser a única coisa que motiva o ser humano a sair da cama todos os dias.E depois tentamos remediar tudo com filtros solares artificiais, que para serem produzidos causam mais desastres ambientais.
A China é hoje é o país mais poluidor do planeta. Estranha coincidência para quem já foi adepta da filosofia do Tao. Lao Tsé, o codificador dessa maravilhosa filosofia, que emulava a virtude do meio e colocava a sabedoria da natureza acima de qualquer outra sabedoria que o homem pensava que tinha ─ inclusive a chamada sabedoria das religiões reveladas─ viveu a mais de dois e quinhentos anos atrás. Ele já previa que um dia chegaríamos ao descalabro que estamos vivendo em nossos dias. Num de seus mais inspirados versos ele escreveu: “quando o Grande Tao foi abandonado, surgiram a bondade e a justiça. Depois surgiram a sabedoria e a prudência, e propagou-se a hipocrisia. Quando os membros da família não se reconheceram mais, surgiram o amor aos pais e a piedade filial. Quando os Estados sofreram a corrupção e a desordem, surgiram os funcionários fiéis.” Sábia constatação. É a descrição do que fazemos hoje: a humanidade procurando criar uma ordem artificial para corrigir a desordem que ela mesma provocou.
Quer dizer. Existe uma ordem natural nas coisas. Quando o homem chega, com seus desejos, suas ambições, sua pretensa sabedoria, ele desequilibra essa ordem natural. Quando começa a sofrer as consequências desse desequilíbrio, ele busca meios de corrigir e remediar os males que causou a si mesmo. Então inventa a justiça, os direitos humanos, a bondade, a piedade e tudo o mais que se convencionou chamar de virtudes humanas ou elementos de civilização. Que no fundo, nada mais são, na ótica do velho mestre do Tao, uma tentativa de remediar o mal que a humanidade fez a si própria destruindo a ordem natural das coisas.  Por isso ele completa esse pensamento com versos como estes: “Renunciai á sabedoria, abandonai a prudência. Será cem vezes mais proveitoso ao povo. Renunciai á bondade, abandonai a justiça, e o povo retornará á piedade filial e ao amor paternal (verdadeiros). Renunciai ao lucro, abandonai a astúcia, e não haverá ladrões nem bandidos.” Quer dizer: Renunciar ás falsas virtudes, que foram desenvolvidas apenas para por no lugar daquelas que perdemos quando deixamos de ser amigos da natureza e fiéis aos seus princípios.
Lao Tsé tinha razão. A natureza não faz nada errado nem deixa existir nada que não tenha utilidade. Tudo que rema contra a natureza provoca desequilíbrio e desordem. Se as águas do céu estão caindo nos lugares errados é porque alguma razão deve haver. Nós provocamos o caos com as nossas imensas aglomerações urbanas, com suas ruas e praças impermeabilizadas e lotadas de detritos e resíduos da nossa científica civilização. Agora, quando chove, as cidades ficam inundadas de água suja, ao mesmo tempo que as nossas niqueladas torneiras, que deviam trazer água limpa para o nosso consumo permanecem secas. Se ao invés de ficarem discutindo quem é mais competente e mais virtuoso, os nossos engenheiros, administradores e políticos botassem suas inteligências para descobrir meios de limpar e canalizar para os reservatórios toda essa água que está afogando a população das nossas grandes metrópoles, quem sabe a própria natureza nos perdoaria e voltaria ao seu equilíbrio natural.
Talvez fosse útil, para todos nós, uma releitura do Tao Te King. Como se diz ali, a verdade frequentemente soa paradoxal. E o Tao do Céu não tem afetos, mas sempre coopera com os homens. (Quando eles não são hipócritas).
 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 24/01/2015
Alterado em 24/01/2015


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