Marx, em suas argutas análises sobre a história das doutrinas econômicas disse que o capitalismo era um regime propício á crises. Daí ele vaticinava que de crise em crise, o capitalismo acabaria destruindo a si mesmo e seria substituído pelo socialismo, o governo dos trabalhadores, porque, segundo ele, só o trabalho criava valor. O capital não. O capital era o resultado da acumulação indevida que alguns indivíduos mais espertos faziam, se aproveitando do esforço alheio.
Teoricamente Marx estava certo. Capital é fruto do trabalho acumulado por algumas pessoas, eu não diria mais espertas, mas mais competentes que outras. Imagino um homem das cavernas que seja hábil o bastante para fazer machados de pedra. Ele faz dois machados. Usa um para sua própria caçada e aluga o outro para um companheiro que não tem habilidade para trabalhar com pedras, com o compromisso de que este pague o aluguel do machado com uma parte da caça que ele conseguir. Depois, como o neandertal artesão vai ter mais caça do que pode consumir, ele vai trocar esse excedente com outro neandertal sem habilidade para a caça, mas digamos, capaz de catar pedras apropriadas para ele fazer mais machados e outras armas de caça, ou então colher frutas silvestres, cujo excedente ele poderá também trocar por outras utilidades. Nasce assim o capitalista, não da esperteza malandra e predadora, como pensam alguns esquerdistas de carteirinha, que botam a culpa de todas as mazelas da economia nos banqueiros e nos empresários, mas sim da habilidade de algumas pessoas com mais tino do que as outras para produzir excedentes com os ele possa trocar por outras coisas que ele não sabe fazer.
A bem da verdade, é preciso fazer justiça ao velho Marx. Na sua crítica ao capitalismo ele nunca ele nunca assumiu a posição de um bispo da Inquisição, ávido para mandar os capitalistas para a fogueira. Ele apenas os apontou como uma figura normal e necessária em um regime de produção que contemplava a propriedade privada em detrimento do trabalho. Enquanto os bens de produção fossem controlados pela atividade privada todas as demais estruturas sociais seriam contaminadas por esse processo. O direito defenderia a propriedade capitalista; a religião seria aquele que a classe dominante escolhesse, a literatura só imortalizaria os heróis saídos das classes privilegiadas, enfim, como ele disse, toda a superestrutura de uma sociedade(religião, direito, política, literatura, etc) eram reflexos da infra estrutura adotada por essa sociedade, ou seja, a sua forma de produção. Daí a metáfora mais reveladora do seu pensamento ser aquela em que ele diz que o moinho de vento fez o suserano e o vassalo e o minho (moinho) a vapor fez o capitalista e o proletário. Quer dizer, na Idade Média, o trigo era produzido nos campos por uma população semi escraviza da e levada para os moinhos de um senhor feudal; na era industrial, em que ele próprio vivia, o trigo era produzido por pequenos proprietários de terra e vendidos a um capitalista que os moía em máquinas movidas a vapor. Em ambos os casos, o lucro da produção sempre ficava, não com quem produzia, mas com quem tinha o capital, representado pela máquina.
Se alguém pensa que esse conflito acabou está muito enganado. Ele ainda sobrevive na cabeça de muita gente, principalmente os ideólogos de esquerda, que pensam que a desenvolvimento econômico pode ser conseguido sem o empresário. Eles pensam que o Estado pode substituir o capitalista assumindo o controle da produção.
Um estado dirigido pelos trabalhadores, claro. Nessa estratégia estava a grande esperança marxista: a de que um dia os trabalhadores ─ únicos criadores de riqueza─ assumissem o poder e promovessem a revolução operária. Os russos acreditaram nisso em 1917, os cubanos em 1959, os chineses em 1949. Cinquenta anos depois todos estão de volta ao velho e bom capitalismo (os cubanos ainda não, mas já estão se preparando para isso).
A verdade é que trabalhador e empresários são os dois lados da mesma moeda. Sem um o outro simplesmente não sobrevive. E não adianta o Estado querer assumir o papel do empresário pois o Estado não é um ente que pense por si mesmo, mas o resultado das cabeças que o comandam. Se o comando é de empresários pensará como empresário; se for de trabalhadores, pensará como trabalhador.
O problema não é a forma como a produção é organizada, mas sim como ela é distribuída. Aí é que o Estado deve entrar. O problema é chegar em uma equação justa que pague tanto ao trabalhador quanto ao empresário a justa parte por aquilo que lhe cabe nesse processo. Até porque nunca se conseguiu afastar desse processo a questão ideológica. E quem parte e reparte, se não fica com a melhor parte, ou é bobo ou não tem arte, já diz o velho ditado popular. E assim quando os empresários mandam eles fazem leis e criam processos para que o capital leve a maior parte; quando são os trabalhadores, eles procuram desenvolver esquemas para que essa equação os beneficie. Podem chamar isso de programas sociais, distribuição de riqueza, erradicação da pobreza, seja o que for, mas no fim é sempre a questão ideológica que dita o merecimento de cada classe.
O capitalismo é, sem dúvida, um regime injusto porque quem tem o capital geralmente fica com a maior parte do produto social. Até porque o próprio capitalista, aqui identificado como empresário, ele também não deixa de ser um trabalhador. Quem nega que o dono de uma empresa, especialmente uma pequena empresa, trabalha até mais que seus próprios empregados? É justo que leve a maior parte. O problema é chegar numa medida justa.
A justiça, nesse caso, penso eu, jamais será alcançada. Até porque justiça é um conceito humano e seu significado não é o mesmo para todo mundo. Assim, todos os políticos que pensam estar fazendo justiça com suas ideologias, de um lado praticando um distributivismo irresponsável, como tem feito o PT nestes anos do seu (des)governo, ou de outro lado, como já fizeram governos anteriores, privilegiando o capitalismo selvagem e sem qualquer responsabilidade com o bem estar do povo, só estão mesmo acirrando o velho conflito, tornando-o cada vez mais insolúvel.
A História tem mostrado que as revoluções populares sempre acontecem para derrubar tiranos que se apropriam dos Estados e governam em benefício próprio e dos grupos particulares que o apoiam. Mas as revoluções populares sempre acabam sendo controladas por líderes demagogos que, que sob a capa de um populismo irresponsável, acabam destruindo o que tem sem por nada melhor no lugar. É o que está acontecendo agora no Brasil, na Venezuela, na Argentina, na Grécia e em outros países que acreditaram em Messias salvadores.
Messias demagogos nem ideologias qe prometem a igualdade social salvam quem quer que seja. Trabalho e conhecimento sim. Vamos trabalhar e estudar, minha gente. A propósito, nenhum capital é mais seguro e produtivo que o conhecimento. Quem o tem não precisa nem de Marx nem de Adam Smith para lhe dizer qual é o regime certo. Nem de Lulas, Cunhas e Renans.
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 26/07/2015
Alterado em 29/07/2015