João Anatalino

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MAÇONARIA- SABEDORIA MESTRE DE OBRAS

                        
     
Sabemos que a criação do mundo, conforme aparece na Bíblia, não é uma matéria que possa ser interpretada literalmente. Se assim o fizermos acabaremos concluindo que ali está dissseminado um conjunto de mitos e crenças sem qualquer apoio na pesquisa histórica e científica. Todavia, por trás dos fatos ali narrados, muitas vezes de forma alegórica, encontra-se uma sabedoria muitas vezes milenária, que tem sido transmitida de forma oral aos sábios de Israel, sábios estes reunidos em uma mítica Assembléia de rabinos, a qual, através dos tempos e da História, a tem compilado e interpretado, reunindo-a em vários livros paralelos á Biblia, que somente são entendidos pelos estudiosos do Judaísmo.
    O termo Torah, (que quer dizer Ensinamento, Lei ) aplica-se aos cinco primeiros livros do Tanach, a Bíblia judaica. Ela é chamada de Pentateuco, ou Sefer Torah, o livro da Torah. Esses são os cinco livros atribuídos à Moisés, mas sabe-se hoje que eles não foram concluídos, em sua versão atual, pelo menos até o período do domínio persa, ou seja, antes de 332 antes da era cristã. Há historiadores que acreditam que tais livros começaram a ser escritos por volta do século VII a.C. no reinado do rei judeu Josias e foram concluídos na época de Esdras, logo após a volta dos judeus do Cativeiro. [1]
    Mas é nos textos posteriores, escritos pelos profetas e pelos intérpretes da Bíblia literal que se encontra aquilo que nós chamamos de sabedoria arcana, ou seja, a sabedoria que fundamenta a Cabala. Destes, interessam principalmente os textos constantes do Talmud e da Mishnah, onde encontramos a interessante estrutura da cosmogonia judaica, arquétipo inspirador da mística adotada pela Cabala, e por reflexo, pela Maçonaria.
     No livro da Criação, chamado Bereshit em língua hebraica, diz-se que “No princípio”Deus criou o céu e a terra. A terra estava vazia e vaga, e as trevas cobriam o abismo e um vento pairava sobre as águas. E Deus disse: ‘Haja luz’ e houve luz. Deus viu que a luz era boa e separou a luz e as trevas. Deus chamou à luz ‘dia’ e às trevas ‘noite’. Houve uma tarde e uma manhã, fazendo o primeiro dia” e assim por diante. (Genesis, 1:1-5).
     Poesia? Mito? Alegoria? Fato da história cosmológica que está sendo descrito de forma simbólica por falta de uma linguagem apropriada?
Em nossa opinião é tudo isso. A sabedoria cabalística diz que o mundo foi feito pelo Poder da Palavra de Deus. A Palavra do Verbo. EU SOU, EU SEREI, disse Deus a Moisés no Monte Horeb. E o gnóstico evangelista João também usa essa concepção no início do seu Evangelho: “No início era o Verbo, O Verbo era Deus e um Deus era o Verbo” escreveu ele no preambulo da sua cr\ônica para justificar a sua concepção de que Jesus Cristo era o filho de Deus encarnado. [2]
     Essa noção também é contemplada pelos escritos Vedas. Para os sábios hindús o poder criador e identificador da palavra de Deus também é visto como fundamental para o exercício da Criação. Em ambas tradições, encontramos a ideia de que é através da palavra denominadora que o universo e a Criação tornam-se manifestos. Corroborando esse fato vemos que depois de criar o homem, Deus o conduz pelo paraíso, onde ordena que ele nomeie todas as criaturas vivas. “Cada qual devia levar o nome que o homem lhe desse” (Genesis, 2:18). E pela palavra o homem reproduz o Ato Criador, dando identidade a todos os seres da Criação e á todas as coisas inanimadas do universo, proporcionando nascimento ao chamado principio da identidade, segundo qual o caos na terra foi organizado.[3]
     Na antropologia cabalística esse momento de Criação é definido pelo termo Chokmah, a Sabedoria, segunda Séfira da Árvore da Vida. Esse conceito aparece, pela primeira vez no Livro dos Provérbios: “Deus me criou, primícias de sua obra, de seus feitos mais antigos; desde a eternidade fui estabelecida, desde o princípio, antes da origem da terra. Quando os abismos não existiam, eu fui gerada, quando ainda não existiam os mananciais de água” (Provérbios, 8: 22-23) .
     É aqui que entra o interesse maçônico nesse estranho conceito da antropologia cabalística. Pois no verso 30 desse livro encontramos um termo definido como “Agur”, que significa “aquele que congrega e espalha verdades”.  Esta palavra, que também se traduz por Amon tem sido traduzida como artífice, mestre-de-obras, construtor. Na Septuaginta ele é traduzido pelo termo harmozousa,   que significa a antítese dos anjos rebeldes. Por analogia eles são os Elhoins, os anjos construtores do universo cabalístico. [4]
A Vulgata o define como componens, os que compõem, os que edificam. Outras interpretações dão-nos Amon como amun, que significa nutrir, mas a tradução mais consensual parece ser a que consta de Provérbios 8:30-31): “Eu [a Sabedoria] estava junto com Ele [Deus] como mestre-de-obras, eu era o seu encanto todos os dias, todo o tempo brincava em sua presença: brincava na superfície da terra, e me alegrava com os homens."[5]
Eis aí a intuição cabalística como inspiração do arquétipo mais importante da Maçonaria, que é a alegoria da construção do edifício cósmico pelo Grande Arquiteto do Universo, através dos Anjos Construtores (Elohins), secundados pelos seus aprendizes (os homens). Essa visão cosmológica do universo maçônico é conhecida na tradição judaica como a “Sabedoria Mestre de Obras.”
(CONTINUA)

 
 
[1] Ver, a esse respeito,Israel Finkelsen e Neil Asher “A Bíblia não Tinha Razão”, publicada pela Ed. Girafa, São Paulo, 2003
[2]  João, 1: 2 a 5
[3] Dai um dos simbolismos maçônicos fazer referência á chamada “Ordo ab Chaos” (Ordem no Caos), como sendo uma das funções da Ordem Maçonica. Da mesma forma que o Principio Criador ordena o caos inicial do universo através das leis naturais, o homem(maçônico) deve fazer o mesmo com o caos social, colocando nele a harmonia do equilíbrio.
[4] Esse termo é encontrado na literatura rabínica como sendo a antítese dos anjos rebeldes, aqueles que foram responsáveis pela queda da raça humana. Ver, a esse respeito, o estudo publicado por George W. E. Nickelsburg- Philadelphia: Fortress Press, 1981
[5] Na Cabala, os anjos construtores são liderados por Jeová- Elhoin, o que fez o homem á sua imagem e semelhança. Na Árvore da Vida Jeová-Elhoein é a segunda manifestação do Princípio Criador, a séfira Chokmah, que significa Sabedoria.            

 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 09/10/2015


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