João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


O CANTO DAS CIGARRAS
 
Quem não gosta de ouvir o canto de uma cigarra, num jardim, anunciando o verão que vai chegar? Eu sempre gostei, pois para mim esse canto me trás a lembrança de tardes quentes e gostosas, convidativas ao lazer. Há quem diga que as cigarras cantam até morrer, mas isso não é verdade. A verdade é que entre esses insetos, só o macho é que canta, e esse canto tem a finalidade específica de atrair as fêmeas para o acasalamento. Cantar faz com que o órgão sexual da cigarra-macho fique intumescido e pronto para receber a parceira.
Não sei porquê o canto da cigarra me trouxe á mente a crise do estado do Rio de Janeiro. Deve ser a lembrança da cidade de Conservatório, bucólica cidadezinha fluminense que ainda mantém a tradição da serenata; ou os fundos dos quintais das casas cariocas que não passam fim de semana sem uma roda de samba; ou as deliciosas praias do Rio e por fim, como não podia deixar de ser, o Carnaval, a Copa do Mundo, as Olimpíadas...
O carioca nunca foi um folgado, como muita gente gosta de dizer, mas já faz tempo que o Rio concentra suas rendas nas atividades da Petrobrás. Lembro-me de um cronista esportivo paulista que criticava o fato de a Petrobrás patrrocinar só o Flamengo. “A Petrobrás”, dizia ele, “pertence ao Brasil e não aos cariocas”. Esse cronista dizia também que o Rio parecia uma imensa colônia de cigarras que só esperava o início do verão para começar a cantar. E a Petrobrás era a floresta, que suas com raízes feitas de petróleo, as alimentava.
O petróleo não acabou, mas os preços que ele consegue obter no mercado hoje já não produzem seiva suficiente para que os alegres cariocas continuem vivendo como cigarras. Até porque, desde os tempos do Brizola, com o seu “socialismo moreno” essa colônia só fez crescer. O Rio tem mais funcionários públicos e aposentados por metro quadrado do que Brasília. Os governos que se seguiram ao velho caudilho gaúcho só contribuíram para aumentá-la. E pior que isso, solaparam, pela corrupção, a floresta que lhes fornecia a seiva, e agora o canto das cigarras já não mais prenuncia a chegada do verão, mas sim, uma estação do mais rigoroso inverno. As cigarras agora cantam nas ruas, não mais saudando o verão que se anuncia, mas a penúria do inverno que bate ás suas portas.
Irresponsabilidade fiscal e falta de juízo financeiro dá nisso. Meu primeiro patrão, um professor alemão, austero e circunspecto, ao me entregar o meu primeiro pagamento, me disse: “lembre-se, meu filho. Difícil não é ganhar dinheiro. Difícil é saber como gastá-lo.” Os nossos governantes deveriam ler diuturnamente a fábula da cigarra e da formiga. Para que o alegre canto de verão não se transforme perenemente em tragédias glaciais, como a que hora tira o sono da alegre colônia de cigarras carioca.

 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 11/11/2016
Alterado em 12/11/2016


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