João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


                                       A SOLIDÃO DA PAPUPA
 
No começo dos anos oitenta fui a Brasília de carro pela primeira vez. Cheguei lá moído, depois de quinze horas ao volante. Meu destino era a Escola de Administração Fazendária (ESAF).  Como era a primeira vez que ia para aqueles lados de carro eu simplesmente errei a entrada da ESAF e fui parar na Papuda, que fica alguns quilômetros depois, na mesma estrada, a rodovia Brasilia - Unaí. 
A ESAF parece um convento. Passar um mês ali dá a impressão que a gente fica pelo menos um ano recluso. Mas era o local onde as melhores cabeças da técnico-burocracia brasileira costumavam ser formadas. 
Diferente da penitenciária da Papuda, onde as piores cabeças do centro oeste do Brasil são confinadas. Ou melhor,  não as piores, mas talvez as mais perversas. Nas horas de folga do meu curso eu e alguns colegas, costumávamos correr pela estrada de Unaí, à guisa de exercício. Ás vezes íamos até o Lago Paranoá, e ás vezes, no sentido inverso, costumávamos chegar até próximo da Papuda. Da estrada podíamos ver a Esplanada dos Ministérios, com seus imponentes edifícios, que pareciam caixotes empilhados em fila.
Não sei se ainda dá para ver a Explanada dos Ministérios da estrada de Unaí. Brasília mudou muito desde então. Tornou-se uma metrópole de grandes proporções.
Hoje ela tem outra face urbana. O que não mudou são os homens que ocupam aqueles edifícios. Aliás, minto. Mudaram sim. Para pior. Hoje, ao ver o nível das pessoas que ocupam aqueles prédios, fico pensando onde nós erramos, desde então. Naquela época, um terço do Congresso era preenchido por indicação do governo militar. Havia muitas excrescências nessas indicações. Paulo Malluf, Jader Barbalho, José Sarney e outras indecências políticas fizeram carreira na sombra da ditadura. E ainda estão lá. Mas hoje, que todos são eleitos pelo voto popular, será que temos menos ou mais excrescências? A impressão é que temos mais, pois agora existe maior visibilidade e os trambiques dessa gente ficam mais expostos. É uma das coisas boas da democracia. Não é a toa que o velho Brutus, senador romano que deu a estocada fatal no ditador Júlio César, justificou o seu desesperado ato dizendo que preferia uma república com um pouco de corrupção do que uma ditadura sem nenhuma liberdade para denunciá-la. 
Em tudo que está acontecendo no Brasil de hoje, há isso de bom. O câncer da corrupção, que se hospeda em todos os órgãos da máquina pública está sendo exposto como nunca antes na história deste país. 
Comecei este artigo falando da ESAF e da Papuda por causa disso. Espero que a ESAF volte a ser um centro destacado de treinamento dos melhores técnicos do serviço público federal, como era naqueles tempos. E que a Papuda abra muitas vagas para hospedar essa gente que anda envergonhando o nosso país. Por que o lugar delas não é naqueles prédios do Planalto, mas sim, na solidão daquele sinistro edifício da Rodovia- Brasília- Unaí.                                      
 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 06/09/2017


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