João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


O segredo da Arca da Aliança
 
     A tradição cabalística trabalha com a crença de que a Torá (a lei judaica contida nos cinco livros de Moisés) foi revelada a Moisés no alto do Monte Sinai. E nessa ocasião ele teria registrado na forma escrita apenas aquilo que poderia ser repassado ao povo como ensinamento formal. O que ele registrou na forma escrita, ele o fezz em código, só decifrável por quem detém o conhecimento secreto que está oculto nas combinações gramáticas e numéricas que se pode fazer com as letras do alfabeto hebraico.
Mas além do que foi escrito na Torá, Deus teria feito a Moisés outras revelações que ele não registrou nos Pentateuco, porém ministrou de forma oral aos seus sucessores. Uma dessas revelações foi a grafia do Verdadeiro Nome de Deus e a maneira correta de pronunciá-lo, pois segundo a tradição cabalística, esse nome é uma palavra de poder. Foi com ela, aliás, que Deus teria se manifestado no mundo da matéria, criando o universo e com ela também teria despertado o homem Adão para a vida
.
     Com efeito, diz a Bíblia que Deus, ao ordenar a Moisés que colocasse na Arca da Aliança as Tábuas da Lei, ordenou-lhe  que junto com elas, depositasse também “o Testemunho que Eu lhe darei.” Esse testemunho, segundo os cabalistas, é o conhecimento de como se escreve e se pronuncia a Palavra Sagrada. Pois seria com esse poder que o povo de Israel se estabeleceria como o "povo escolhido" e realizaria o propósito de Deus sobre a terra.
Gershon Scholen também se mostra convicto que esse “tes-temunho” era, indubitavelmente, o conhecimento da Palavra Sagra-da, pois segundo esse autor, “era admitido pelos pensadores esotéricos judeus daquela época que céu e terra haviam sido criados pelo grande nome de Deus. Ao construir o Tabernáculo, Belazel fora capaz de imitar a Criação, ainda que em pequena escala. Pois o Tabernáculo é um microcosmo completo, uma cópia de tudo quanto existe no céu e na terra”.[1]
O conhecimento da Palavra Sagrada, contida nas iniciais YHVH, denotaria assim a existência de uma relação mais profunda entre o "Eterno Deus" e sua obra e não poderia ser usada em vão, razão pela qual Moisés a transformou em um dos preceitos mais importantes do Decálogo, ou seja, a proibição tácita de pronunciar o Nome de Deus em vão.
 
A maçonaria e a palavra sagrada
 
     Na Maçonaria esse tema é trabalhado em váarios dos seus graus filosóficos, com especial enfoque nos graus treze e quatorze que adotam como núcleo simbólico do ensinamento que ali se veicula a alegoria da procura pela Palavra Perdida. Essa é uma alegoria que evoca o poder místico que o Verdadeiro Nome de Deus possui. A Palavra Perdida que ali se procura é o chamado Nome Inefável, o qual está grafado sobre a Pedra Cúbica. Esses graus, também denominados “ Cavaleiro do 9º Arco”, “Real Arco de Enoque”, “Real Arco Escocês” e “Real Arco de Salomão” falam da Lenda de Enoque, descendente de Cain, para quem este construiu uma cidade á qual deu o seu nome.[2]  Essa cidade, segundo a  lenda do grau, teria sido destruída pelo dilúvio e dela só teria restado duas colunas de bronze onde Enoque escreveu as letras do Nome Sagrado.  
     É por isso que a decoração da Loja, nesses graus, evoca um subterrâneo sem portas ou janelas, cuja única comunicação com o exterior é uma pequena abertura quadrangular na abóbada, em forma de escotilha, que se atinge através de uma escada. Por dentro, as paredes são brancas e o pavimento formado de quadrados brancos e negros. No centro da Loja, sob um pedestal de forma quadrangular, ergue-se uma pirâmide transparente, de três faces, onde, em cada uma delas, está inscrito em letras hebraicas as letras que formam os nomes do Grande Arquiteto do Universo. A abóbada está sustentada por nove arcos, nos quais nove dos prováveis nomes de Deus estão inscritos.[3]
      O conteúdo iniciático do grau, como se pode perceber, repousa no simbolismo do Inefável Nome de Deus, ressaltando que a verdadeira sabedoria está contida no conhecimento dessa Palavra Sagrada. 
      Quando comunicado por iniciação, somente três iniciados de cada vez podem receber este grau. Um dos iniciandos, em nome dos demais, faz a profissão de fé dos graus anteriores, repetindo as virtudes adquiridas e os trabalhos realizados em cada um deles, salientando que agora, depois de passar por diversas provas, está apto a conhecer o Verdadeiro Nome de Deus. Por isso é que se diz que o objetivo do grau é o conhecimento dessa Palavra Sagrada, o que, inclusive, dá sentido aos graus das Lojas de Perfeição, pois esses graus de aperfeiçoamento são destinados principalmente á pesquisa e conhecimento dessa Palavra. Conhecimento esse que, segundo a tradição cabalística, confere ao seu detentor a verdadeira Gnose, que é comunicada através da Lenda das Colunas de Bronze.
    
O tetragrama sagrado

      Na Maçonaria o simbolismo que envolve o Inefável Nome de Deus é um tema de grande importância iniciática. De uma forma geral, os maçons adotaram a tradição cabalística de que o verdadeiro significado desse Nome é um segredo guardado a sete chaves pelos Mestres da sabedoria arcana. Assim, os ritos maçônicos trabalham com a ideia de que os sons vocálicos originais do tetragrama YHVH são interditos ao vulgo e a pronúncia correta dessa palavra está confinada à sabedoria de muitos poucos escolhidos. É um conceito semelhante ao adotado pelos cabalistas e diferente da crença islâmica, para a qual essa sabedoria está vedada para toda a raça humana.
Essa ideia, como já referido, está expressa na alegoria da Palavra Perdida, cujo conteúdo é desenvolvido no ritual dos graus 13 e 14 do Rito Escocês através da Lenda de Enoque e as duas colunas perdidas. Em resumo essa lenda diz o seguinte:
      Enoque, durante um sonho que teve, foi informado que Deus tinha um Nome Verdadeiro que aos homens não era lícito saber, porque se tratava de uma palavra de grande poder. Esse Nome, Deus comunicou aos seus ouvidos, mas proibiu que o divulgasse a qualquer outro ser humano. O Senhor o informou também sobre o castigo que iria ser lançado sobre a humanidade pecadora, através do dilúvio.
O Inefável Nome de Deus era a chave que poderia proporcionar aos homens todo o conhecimento secreto e um dia, quando fossem merecedores, ele lhes seria revelado. Mas para que essa Palavra Sagrada não fosse perdida após a catástrofe que destruiria a humanidade inteira, Enoque gravou-a numa pedra triangular, numa língua só inteligível aos anjos e a ele próprio (a línguagem da Cabala). Portanto, mesmo que alguém descobrisse um dia a grafia do Nome Verdadeiro de Deus, isso de pouco adiantaria ao seu descobridor, pois a pronúncia dessa Palavra Sagrada lhe estaria interdita.
[7]


Antes do dilúvio havia sobre a terra civilizações bastante desenvolvidas em termos de artes e ciências. Eram civilizações lideradas por homens gigantes, filhos que os anjos caídos (os nefilins da Bíblia) tiveram com as filhas dos homens. Essa civilização era má, arrogante e descrente. Por isso Deus anunciou a Enoque que iria destruí-la. Para preservar os conhecimentos dessas antigas civilizações Enoque fez com que vários textos, contendo conhecimentos científicos (aqueles de Jubal, Jabel e Tubal Cain haviam gravados nas Colunas de Bronze) fossem copiados e gravados em duas colunas, e em cada uma delas esculpiu o nome sagrado.
Uma delas era feita de mármore, a outra fundida em bronze. Essas colunas ele as pôs como sustentáculo em um suntuoso templo que mandou construir em um lugar subterrâneo, só dele e de alguns eleitos, conhecidos.  Esse templo tinha nove abóbadas, sustentadas por nove arcos. No último arco Enoque mandou gravar o Delta Luminoso, que registrava o Nome Inefável, e fez um alçapão onde guardou a pedra na qual ele havia gravado esse Nome.
Com o evento do dilúvio todas as antigas civilizações foram destruídas e seus conhecimentos científicos e artísticos perdidos. Noé e sua família, os únicos sobreviventes dessa catástrofe, nada sabiam dessas antigas ciências. Das colunas gravadas por Enoque, somente a de bronze pode ser recuperada pelos descendentes desse patriarca. Nela constava o Verdadeiro Nome de Deus, mas não a forma de pronunciá-lo, pois essa sabedoria tinha sido gravada na coluna de mármore. Assim, essa pronúncia permaneceu desconhecida por muitos séculos, até que Deus a revelou a Moisés em sua aparição no Monte Sinai.
Mas Moisés foi proibido de divulgá-la, a não ser ao seu irmão Aarão, que seria, futuramente, o Sumo Sacerdote do povo hebreu. E este ao seu sucessor como Sumo Sacerdote, tradição essa que continuou sendo praticada até a destruição do primeiro Templo.  
Deus prometeu a Moisés, todavia, que mais tarde o poder desse Nome seria recuperado e transmitido a todo o povo de Israel. Segundo a tradição cabalística isso só aconteceu nos tempos de Shimon Ben Iohai, o codificador da Cabala, mas nem todo o povo de Israel compartilhou dessa sabedoria, uma vez que ela continuou sendo transmitida apenas aos rabinos que atingiam os graus mais altos na chamada Assembléia Sagrada, os chamados sacerdotes Kadosh.
   Em resumo, esse teria sido "o testemunho" que Moisés teria depositado na Arca da Aliança, juntamente com as duas Tábuas contendo os Dez Mandamentos. Registre-se, outrossim, que o próprio Decálogo, em sua inspiração arcana, não era apenas um código de leis e preceitos, feito para guiar a vida moral e social do povo de Israel. Ele próprio era um simbolismo que retratava a própria Arvore da Vida, em cujas dez esferas de energia está retratado todo o processo pelo qual o Criador constrói o univeso e o dirige. 

( Excerto do nosso livro "CABALA E MAÇONARIA"- A INFLUÊNCIA DA CABALA NOS RITOS MAÇÔNICOS" proximo lançamento da Editora Madras.
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[1] A Cabala e Seu Simbolismo, citado, pg. 199.
[2] Gênesis, 4;17.
[3] Esses nomes, segundo a lenda maçônica são, pela ordem, Joe, João, Iria, Ele, Jarí, Adonai, Al-Hanan, Jiha, Jobel. A filosofia do grau está baseada na Lenda de Enoque.
[4] Ranulf Higden  (c. 1280 – 1364) foi um monge beneditino que se tornou famoso pela sua extensa crônica sobre história universal e teologia.
[5] James Anderson- As Constituições, Ed. Fraternidade, 1982.
[6] Robert Ambelain- A Franco -Maçonaria. São Paulo, Ed. Ibrasa, 1999.
[7] Na imagem, o Delta com o tetragrama sagrado. Imagem: Wikipédia Fundation.
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 19/12/2017
Alterado em 22/12/2017


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