Pensamentos desconexos que se conectam no inconsciente. A gente acha que um não tem nada a ver com o outro, mas tem. Se não tivesse a gente não pensava. O cérebro é que nem uma placa de circuito impresso. Tudo nele está ligado. Nos anos sessenta e setenta, época dos hippies, era moda fazer literatura, música e poesia do pensamento desconectado. Influência das drogas alucinógenas. LSD, cocaína, maconha. Beetles, Roling Stones, Bob Dylan, Alan Ginsberg, Peter Kerouack, Janis Joplin e semelhantes, embalados pela guerra do Vietnã, e aqui pela ditadura militar.
Caetano Veloso bolou uma canção que misturava guerras, noticias de jornais, espaçonaves, Coca-Cola, Claudia Cardinale, casamento, TV, a preguiça baianista e a brejeirice macunaímica do povo brasileiro que viaja pela vida sem lenço e sem documento.
Foram duas mocinhas vestidas de senhoras que me despertaram essas lembranças agora de manhã, quando eu dava a minha caminhada diária pela praça, em frente ao meu apartamento. Na plenitude da terça-feira dos operários, quando os ecos das manifestações dos sindicalistas e dos membros dos movimentos sociais (que Deus perdoe o cara que deu esse nome para esses indivíduos) ainda não se dispersaram, as duas mocinhas, bonitinhas e meigas, simpáticas até á medula, estavam lá, com suas saias abaixo do tornozelo, cabelos compridos quase chegando na cintura, blusas fechadas até o pescoço, naquele calor das dez horas da manhã, postadas em frente de uma barraquinha montada na praça, vendendo revistas religiosas e fazendo pregação para quem se dava o luxo de parar e ouvir.
“O Salvador está chegando”, diziam elas a todos que passavam. Quase olhei para trás para ver se por acaso o Lula não estava vindo atrás de mim, mas não quero ser irônico. Hoje não, que é Dia do Trabalho. Então logo me bateu na cabeça o quanto os nossos pensamentos podem ser desconexos, pois logo pensei que para a gente acreditar em um salvador era preciso primeiro descobrir se existe uma alma para ser salva, e depois dessa descoberta ter a certeza de que ela merece ser salva. E depois disso tudo ainda descobrir que tipo de qualidades e personalidade teria que ter esse salvador para que a gente acreditasse nele sem desconfiar. Tantos já vieram e já se foram e a humanidade parece cada dia mais perdida...
E aí me dei conta que essas mocinhas eram da seita Testemunhas de Jeová. Adquiri uma simpatia por essa gente depois que descobri que junto com os judeus, os ciganos e os maçons, as Testemunhas de Jeová foi um dos grupos perseguidos pelos nazistas. E logo me veio á cabeça também que um juiz lá no Rio proibiu a publicação do Mein Kampf do Hitler, como se estivesse fazendo um grande bem para os pobres e iletrados brasileiros que não conseguem ler nem gibi. Enquanto isso, rolam as manifestações a favor do Lula, contra a reforma da Previdência e das leis trabalhistas, com um monte de vândalos mascarados desfilando pelas ruas, quebrando vidraças de lojas e bancos, viciados consumindo drogas em locais públicos, crianças e adolescentes assaltando turistas, milicianos fazendo festa, traficantes faturando alto e dividindo os lucros com a polícia... E quem não quiser ver tudo isso pode se divertir com o BBB, que, graças a Deus já acabou e agora só no ano que vem.
As mocinhas, Testemunhas de Jeová, continuam cantando o seu mantra: ”O Salvador está chegando”. Claro, não é do Lula que elas estão falando. Mas não posso deixar de pensar que essa seita também faz parte do grupo que chama a si mesmo de evangélicos, como se os demais cristãos também não se guiassem pelos quatro livros apostólicos que os bispos de Niceia, em 325 da Era Cristã, decidiram que eram os únicos que mereciam credibilidade. E nessa esteira de pensamentos sem lenço e sem documento não posso evitar de pensar que o Eduardo Cunha, o Sérgio Cabral, o Marcelo Crivela e outras “tranqueiras” que assolam o país, também são evangélicos e foram eleitos pela comunidade que se diz evangélica.
Está soprando um ventinho gostoso. Caminhando contra o vento vai o meu pensamento sem lenço e sem documento. Como o povo brasileiro, que nunca teve, de verdade, uma coisa nem outra. Até porque, neste país, lenço só serve para enxugar lágrimas e documento só para mostrar para a gente mesmo que nós também não somos meros pensamentos desconexos a quem Deus se esqueceu de dar sentido.
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 02/05/2018
Alterado em 02/05/2018