O CLUBE DOS CORNOS
Na minha juventude os costumes eram mais rígidos e controlados do que são hoje. Todo mundo sabia quando uma garota deixava de ser virgem. Ela ganhava um carimbo que a marcava de forma indelével. Quando passava na rua, as donzelas casadouras e as senhoras sem mácula a chamavam de “essa aí”. Era a mesma coisa com os garotos que fumavam maconha, o ladrãozinho do bairro, o garoto que fazia dezoito anos e “ainda não trabalha”, o caloteiro que não pagou o carnê, etc. Nem a nossa sociedade Big-Brother de hoje, com suas câmaras espalhadas por toda parte, fiscalizava melhor os comportamentos alheios que as nossas velhas “Candinhas”, que sabiam de tudo e ficavam nas janelas das casas trocando “informações”.
Em nosso bairro havia um sujeito que era corno. Todo mundo sabia que a mulher dele o traia. Menos ele. Para nós parecia impossível que ele não soubesse, pois a dita cuja não fazia muita questão de esconder. A coisa era tão escancarada e escandalosa, que um dia, um dos nossos colegas, não conseguindo mais segurar a bronca de ver um amigo sendo chifrado daquele jeito, tomou coragem e cobrou uma atitude dele para por fim naquela safadeza. A resposta que ele deu merece reflexão:
─ Eu sei disso, meu amigo e agradeço a sua solidariedade. Mas o que quer que eu faça?
─ Larga essa mulher, cara. Ela está envergonhando você ─ disse o colega, indignado.
─ Se eu largar ─ respondeu ele, prosaicamente ─ vou ter que arrumar outra. Quem me garante que ela não vai me enganar também? Com a Maria eu já sei como é. Com outra eu não sei como será.
Lembrei-me desse nosso velho amigo corno ao ler os jornais do dia. Pesquisa Ibope aponta que Lula e Bolsonaro ficariam quase empatados numa possível eleição presidencial. Isso significa que se a eleição fosse hoje, tudo continuaria como está ou voltaria a ser como já foi. Ser corno hoje talvez não incomode tanto quanto nos meus tempos de juventude. Não diria que virou moda, mas parece que essa situação também foi emancipada. Existe até um Clube dos Cornos, em Brasilia, que congrega homens e mulheres que já passaram pela experiência de descobrir que seus parceiros lhe botaram vistosas galhadas. O fato de esse clube ter nascido exatamente em Brasilia, é emblemático. A gente nem sempre sabe o porquê das coisas, mas que tudo tem um motivo, isso tem. Um clube como esse só poderia mesmo nascer lá.
Talvez doa menos ser enganado por alguém que a gente já conhece do que se arriscar com estranhos que a gente não sabe se vai ser pior. É assim que emancipamos o vício, o crime, os maus costumes, a corrupção e tudo o mais. Se acostumando com a situação e aprendendo a conviver com ela. Os cariocas que o digam. Assim sendo, só resta dizer a todos os brasileiros: ─ Bem-vindos ao Clube dos Cornos.
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 10/12/2019
Alterado em 11/12/2019