João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


Muito desta história não possui registo, pelo menos até a presente data.
Em linhas gerais a maioria dos cargos em Loja foram criados conforme a vertente maçónica e de acordo com a necessidade litúrgica do rito (a sua cultura, costumes, estrutura doutrinária, etc.).
Para o desenvolvimento das considerações que se seguem será utilizado como parâmetro a Maçonaria Primitiva (de Ofício) do século XVII na Escócia e o seu alcance sobre a Maçonaria Inglesa no século XVIII, seguida da Maçonaria Francesa.
No princípio a Maçonaria de Ofício em território escocês possuía somente duas classes de trabalhadores, a dos Aprendizes Admitidos (registados por aproximadamente sete anos) e a dos Companheiros do Ofício. Dentre estes últimos eram escolhidos os Mestres da Loja e o Mestre da Corporação – uma corporação poderia possuir mais do que uma Loja.
No tocante ao título de Mestre, nessa época ele ainda não era considerado um grau especulativo, tal como é conhecido actualmente. No período do ofício (Maçonaria Operativa) o Mestre era apenas o cargo de dirigente, administrador ou mesmo o proprietário da guilda.
É na Escócia deste período que aparecem os Wardens, personagens identificados como guardiões, zeladores ou directores, podendo ser algumas vezes até o dirigente maior de uma corporação de construtores.
Somente por volta de 1730 é que o Warden ficaria genericamente conhecido como Vigilante, no caso, os dois Vigilantes inseridos como auxiliares do Venerável Mestre. Vale mencionar que que Vigilante, ou Warden, é um cargo e não um grau iniciático.
Ainda no que se refere à Maçonaria primitiva, havia também o Deacon (Diácono), mas não aquele relacionado aos antigos oficiais de chão a exemplo dos mencionados por Harry Carr no seu Masons At Work, porém o Diácono que era às vezes até mesmo o próprio dirigente da guilda – na Escócia operativa o termo Diácono possuía o sentido de “enviado”.
Cabe aqui outra observação. O Diácono relativo à Maçonaria primitiva escocesa também não possui nenhuma relação com os Diáconos irlandeses da Grande Loja dos Antigos que mais tarde, no século XVIII, seriam extensivamente adoptados como guias na ritualística dos ritos e rituais da Moderna Maçonaria.
Assim, para o nosso comentário é possível dizer-se que tanto o Warden como o Deacon eram cargos já existentes na Maçonaria primitiva na Escócia.
Também não há como negar que este primitivo sistema de cargos do século XVII iria mais tarde influenciar a Maçonaria Inglesa, nomeadamente nas guildas londrinas como a da Companhia dos Maçons de Londres.
Cabe registar que já nesta época primitiva também se faziam presentes nas Lojas um secretário-tesoureiro, ou mesmo um secretário e um tesoureiro que actuavam como importantes funcionários na vida administrativa da Loja. Os ocupantes destes cargos eram homens que não exerciam o ofício de pedreiro, isto é, não eram profissionais da cantaria e nem assentadores e ajustadores.
No século XVIII, com o aparecimento da Primeira Grande Loja londrina no ano de 1717, era inaugurado o sistema obediencial, marco da Moderna Maçonaria. Mais precisamente na sua primeira Constituição, datada de 1723, e conhecida como a Constituição de Anderson, dela o seu Título IV, aparecem nominados, Mestres, Vigilantes, Companheiros e Aprendizes, contudo vale repetir que o Mestre ali mencionado ainda não era o grau especulativo de Mestre Maçom, mas o do cargo de Mestre da Loja, ou Worshipful Master (Venerável Mestre). Registe-se que o grau de Mestre Maçom somente seria citado oficialmente na segunda Constituição que fora publicada no ano 1738.
É neste período o aparecimento de dois Vigilantes (Wardens) distribuídos na Loja, agora sendo o 1º Vigilante, ou o Sénior Warden e o 2º Vigilante, ou Junior Warden.
Com isto, de certo modo era constituída uma ordem hierárquica entre o grau de Aprendiz e o de Companheiro, sendo que este último ainda era qualificação indispensável para se assumir o cargo de Vigilante e posteriormente o de Mestre da Loja. Aprendizes e Companheiros como graus, Vigilantes e Mestre da Loja como cargos.
Vale mencionar que o termo Vigilante como sinónimo de Warden acabaria consagrado na Moderna Maçonaria.
Ainda em relação aos cargos, há que se separar aqueles relacionados às Lojas e aqueles relativos à Grande Loja. Esta última trazia no artigo 17 do seu Regulamento Geral os cargos de um Grão-Mestre, um Grão-Mestre Adjunto, dois Grandes Vigilantes, um Tesoureiro e um Secretário.
Assim, é preciso separar os cargos de uma Loja e os cargos inerentes às autoridades que administram a Grande Loja.
No que diz respeito aos estudos e pesquisas sobre o tema, cabe lembrar que nos primeiros anos de existência da primeira Grande Loja londrina, de 1717 a 1723, não existem registos de documentação. As suas actas somente passam a ser registadas de 1723 em diante, ano da promulgação da primeira Constituição de Anderson.
Somente em 1738, ano da publicação da segunda Constituição é que seriam reconstruídas por James Anderson as actas dos primeiros anos de existência da Grande Loja. Compete lembrar que essa é uma reconstrução de actas, portanto não são registos originais, podendo sobre eles existir a possibilidade de contradição. Conforme menciona Anderson nos seus registos reconstruídos, havia na Grande Loja em 1717 um Grão-Mestre, cujo cargo era ocupado pelo Irmão Anthony Sayer, esse investido pelos mais antigos Mestres de Loja então presentes. É mencionada também a existência de dois Grandes Vigilantes.
Com base nestes registos é bastante provável que a utilização de um Venerável e de dois Vigilantes conduzindo uma Loja seja costume haurido das quatro Lojas fundadoras da Primeira Grande Loja. Desta maneira, a constituição administrativa da Loja formada por um Venerável e dois Vigilantes acabou por se conservar em toda a Moderna Maçonaria.
Mas pergunta-se: e o Mestre Maçom como grau iniciático? Quando ele apareceu? A bem da verdade, a semente desse grau germinou em Londres no ano de 1725 dentro de um clube profano denominado Philo Musicae et Architecturae Societas Apollini.
Clube composto apenas por maçons da Grande Loja, artistas, matemáticos, cientistas, todos membros da Royal Society, foi nele que o Duque de Richmond, Venerável Mestre da Loja da Taverna Queen’s Head, na intenção de criar um título diferenciado para o dirigente da Societas Apollini, esta seria composta só por maçons, acabou plantando a semente do que num futuro próximo ir-se-ia tornar um grau exclusivamente maçónico – o de Mestre Maçom.
Os primeiros maçons a assumirem o cargo de dirigente da Societas Apollini foram Charles Cotton e Papilon Bull. Dado a isso é que ambos são considerados como os dois primeiros Mestres Maçons especulativos da história.
Com o sucesso da criação de Richmond, a sua ideia logo acabaria na Primeira Grande Loja – destaque-se que o Duque de Richmond era possuidor de grande prestígio, sobretudo por já por ter sido Grão-Mestre. Assim, logo a Grande Loja aperfeiçoou e adoptou o novo sistema como o 3º Grau do Franco-maçónico básico universal – Grau de Mestre Maçom.
É bem verdade que não há registos se os dois primeiros maçons foram feitos Mestres na Loja ou no Clube, mas o que se sabe é que pelo alto conceito que gozava o Duque de Richmond, na cerimónia estiveram presentes os dois Grandes Vigilantes da Grande Loja. Se houve ou não irregularidade não se sabe, mas o facto é que essa performance logo seria adoptada pela Primeira Grande Loja.
Conjugado ao então novo grau, o de Mestre Maçom, aparece a lenda hirâmica, provavelmente adaptada de uma antiga lenda noaquita (relativa a Noé) que aparece no Manuscrito Graham datado de 1726, comum ao antigo e genuíno grau de Companheiro que seria desdobrado para dar origem ao terceiro grau. A partir daí os C∴ PP∴ PP∴ do Companheirismo passam a pertencer ao grau de Mestre Maçom, agora denominados como os C∴ PP∴ PP∴ do Mestrado.
Consolidado o grau de Mestre Maçom, consagra-se então o currículo iniciático de Aprendiz, Companheiro e Mestre nas Lojas pertencentes Primeira Grande Loja. Os Vigilantes são agora escolhidos dentre os Mestres Maçons e aquele que desejar tornar-se um Venerável Mestre (Mestre da Loja) é preciso antes ter sido um Vigilante.
Vale lembrar que na Moderna Maçonaria o termo “Mestre” designa o grau iniciático que encerra a plenitude maçónica, assim como assinala também o maior cargo administrativo da Loja – o Mestre da Loja ou o Venerável Mestre (Worshipful Master).
Em relação aos Diáconos, oriundos dos “antigos oficiais de chão” da Maçonaria de Ofício, na Moderna Maçonaria inglesa não existe, a respeito deles, nenhuma citação antes de 1740, época em que os irlandeses se começam a manifestar e influenciar a liturgia maçónica da época.
Na famosa revelação (exposure) de autoria de Samuel Prichard, datada de 1730, intitulada Masonry Dissected, por exemplo, é possível conferir que os Diáconos não tinham ainda ofício de receber e conduzir candidatos como aconteceria mais tarde no Craft (Maçonaria Inglesa). Como nos tempos primitivos, o ofício de receber e instruir candidatos era de obrigação do 2º Vigilante.
Embora com funções diferenciadas dos da vertente moderna inglesa, no século XVIII o cargo de Diácono logo não tardaria a aparecer também na vertente francesa de Maçonaria. Cite-se como exemplo neste caso o REAA, onde nele os dois Diáconos (1º e 2º) actuam apenas como os antigos oficiais de chão para relembrar a velha função dos mensageiros que operavam nos primitivos canteiros de ofício da Idade Média.
Isto explica no REAA o porquê da liturgia da transmissão da Palavra Sagrada entre as Luzes da Loja e os Diáconos durante a abertura e encerramento dos trabalhos. Note que ao contrário do Craft, no escocesismo os Diáconos não actuam como guias e receptores.
Diferente do Warden, ancestral cargo das lojas primitivas escocesas que facilmente seria implantado na Inglaterra como Vigilante, o cargo de Diácono, provavelmente por ser estranho às organizações de ofício inglesas, acabou levando mais tempo para ser recebido e fixado no Craft. Na verdade, deve-se aos irlandeses da Grande Loja dos Antigos (1751) a propagação e a fixação do cargo de Diácono na Moderna Maçonaria inglesa.
Em relação ao cargo do Tyler (Telhador ou Cobridor Externo), foi James Anderson na Constituição de 1723 quem mencionou um cargo cujo ofício era o de proteger e guardar a porta da Grande Loja.
Ainda não há como se afirmar da existência do Tyler, ou Cobridor Externo nas Lojas, embora seja provável ter existido alguém encarregado pela segurança do recinto para preservar o sigilo dos trabalhos contra os cowans.
Ainda relacionado à protecção da porta, porém agora pelo seu interior, existe o cargo de Cobridor Interno (Inner Guard). A seu respeito, acredita-se que, tal como outros cargos, também o de Cobridor Interno tenha sido adoptado por primeiro pela Primeira Grande Loja para só depois se fixar nas Lojas da sua jurisdição.
Em relação ao cargo de Tyler e a Maçonaria Francesa, somente a partir dos meados do século XVIII é que o ofício de “Tuileur”, que em tradução livre significa Cobridor, seria adoptado.
Dentre outros, não há como negar o empenho da primeira Grande Loja londrina em estruturar os cargos das suas Lojas. Conforme mencionam alguns autores, desde 1727 ela adoptou para o Venerável Mestre e os Vigilantes das suas Lojas jóias distintivas para os cargos, cujos quais iam pendentes de fitas brancas. Poucos anos depois, em Março de 1731, os aventais decorados e debruados ficavam reservados ao Venerável Mestre e aos Vigilantes. Tempos a seguir, a cor branca dos colares e da seda que ia debruada nos aventais dos Grandes Oficiais passaria a ser de matiz azul.
Sem embargo do que até aqui fora mencionado, constata-se que a estrutura da Maçonaria Inglesa nos primórdios da sua primeira Grande Loja se derivou das estruturas da Maçonaria Escocesa do século XVII.
É inegável que durante transição de toda essa estrutura tenha havido uma série de mudanças, das quais pelo menos duas merecem destaque, mormente por actuarem de modo abrangente no sistema especulativo da Moderna Maçonaria.
t sentido, cabe então destacar:
  1. A presidência da Loja passou a não mais ser creditada apenas a um “Warden” (guardião, vigia, director, administrador [manager], principal), mas a um “Master of Lodge” (Mestre da Loja);
    O Mestre da Loja passou a ser auxiliado por dois Vigilantes – “três governam a Loja”.
Ressalte-se que esta nova estrutura, composta por um Venerável Mestre e dois Vigilantes, vai disseminar-se a tal ponto de ser a única conhecida já a partir de 1740.
Um novo acontecimento, contudo, acabaria desenhando novos rumos no andamento dessa história na Inglaterra. Em 1751, um outro sistema estrutural, com costumes e tradições próprias e importado por maçons irlandeses iria aparecer. É quando surge então uma nova Grande Loja em oposição à primeira que fora fundada em 1717.
Esta Grande Loja, a de 1751, trazia na sua formação maçons que se auto denominavam “Antigos” porque alegavam possuir uma tradição mais velha do que os da Grande Loja de 1717. Dado a isso eles atribuíam pejorativamente aos membros da primeira Grande Loja o adjectivo de “Modernos”.
A bem da verdade, nesta disputa por antiguidade entre as duas Grandes Lojas rivais existe um paradoxo, pois atribui-se o título de antiga àquela que nasceu depois, e de moderna àquela que nasceu antes.
Há uma explicação para esta contradição. Em linhas gerais esta disputa por antiguidade dá-se pela defesa do sistema trazido pela Grande Loja de 1751, e não propriamente pela data de fundação. Neste contexto então alguns factores acabariam arrefecendo as escaramuças entre os Modernos e os Antigos ingleses.
Numa abordagem superficial sobre o facto poder-se-ia então citar dois factores principais nesta altercação:
  1. O primeiro é o que se deu pelas alterações produzidas pelos “Modernos” na forma de trabalho. Dentre outros, os “Modernos” simplificaram a liturgia maçónica, inverteram a tradicional posição das Colunas B e J para J e B, omitiram orações, promoveram a descristianização dos catecismos, etc.
    O segundo pode-se dizer que foi pela aristocratização, até certo ponto imposta à Moderna Maçonaria inglesa, principalmente pela sua estreita relação com a Royal Society e, por extensão, com a coroa britânica.
Também em relação ao primeiro factor, muitas adulterações se devem às obras espúrias que, mediante boa recompensa financeira, revelavam nos jornais londrinos da época as formas de trabalho e outras particularidades da ritualística maçónica. Devido a isso os Modernos acabaram promovendo substanciais mudanças na liturgia com o intuito de confundir os bisbilhoteiros que constantemente espiavam para revelar “segredos” nos semanários londrinos – destaque-se, por exemplo, a exposure de 1730 escrita por Samuel Prichard e publicada na Inglaterra sob o título de Masonry Dissected. Esta obra trazia revelações atinentes aos trabalhos maçónicos.
Ainda referente ao primeiro factor, nota-se que a primeira Constituição, a de 1723, trazia um teísmo abrandado, isto é, com feições deístas ajustadas às conveniências daquela época – isso apesar de James Anderson ter sido um pastor protestante.
Com isso muitas orações que ocorriam durante os trabalhos maçónicos acabaram sendo omitidas, o que resultou numa espécie de descristianização dos catecismos maçónicos, inclusive com a supressão de muitas festas patronais.
Pertinente ainda ao segundo factor, notadamente a primeira Grande Loja já se preparava para num breve futuro actuar ligada à coroa inglesa. A sua estreita relação com os membros da Royal Society dá uma ideia essa intenção.
Paga a pena mencionar que esta logística de conjuntura estrutural não agradava a totalidade dos maçons ingleses, sobretudo os irlandeses que, de berço mais humilde, não se sentiam à vontade com a aristocratização da Grande Loja.
É certo que estes dois factores contribuíram substancialmente para o aparecimento em 1751 de outra Grande Loja então fundada pelo irlandês Lawrence Dermott. Os membros dessa Grande Loja se autodenominavam de “Antigos” por alegarem ser os guardiões dos “velhos costumes”.
Com severas críticas àqueles que alteraram a forma tradicional de trabalho, os autodenominados “Antigos”, de modo pejorativo, então taxavam os integrantes da primeira Grande Loja de “Modernos”.
O aparecimento desta Grande Loja rival na Inglaterra logo daria início a uma longa rivalidade entre os “Modernos” e os “Antigos”, rivalidade essa que duraria até Novembro de 1813 quando as duas Grandes Lojas adversárias, através do Acto de União, ir-se-iam unir e criar a Grande Loja Unida da Inglaterra.
Registe-se que a aproximação, reconciliação e união das duas Grandes Lojas inglesas é uma história a parte que merece ser cuidadosamente perscrutada.
Estabelecida a Grande Loja dos “Antigos”, em 1772, procurando demonstrar a sua rivalidade para com a primeira Grande Loja, ela elaborou uma lista de pontos que estavam em desacordo com os “Modernos”, dos quais alguns, como se verá a seguir, mostram-se relevantes na evolução dos cargos em Loja desde os tempos de rivalidade até o Acto de União de Novembro de 1813.
Venerável Mestre – Em relação a este cargo, os irlandeses da Grande Loja dos Antigos desaprovavam com veemência o facto de que os “Modernos” ignoravam a prática de instalação do Venerável na cadeira da Loja, principalmente porque os Antigos tinham nesta cerimónia um meio de acesso ao Arco Real, uma espécie de extensão do mestrado considerada como tradição para os irlandeses. Sobre isso, alguns autores até mesmo afirmam que os “Antigos” o consideravam como um grau relacionado à cúpula da Maçonaria.
Considerações à parte, e segundo respeitáveis tratadistas, o Arco Real foi inserido nas práticas dos “Antigos” por Lawrence Dermott com o fito de chamar atenção e cooptar obreiros para a sua Grande Loja que rivalizava com a dos Modernos.
Sob este artifício, Dermott adaptou uma lenda que, em linhas gerais, trazia na sua narrativa o conto sobre uma abóbada que fora encontrada intacta sob as ruínas do Templo de Jerusalém, etc., etc. Isso sem dúvida causou uma óptima impressão nos maçons da época que acorreram para ingressar e engrossar as fileiras da Grande Loja dos Antigos.
Num aparte sobre este facto, note-se que a curiosidade e procura de novidades não é apenas um atributo dos latinos.
Sobre a instalação do Venerável Mestre na cadeira da Loja, até 1760 não é encontrado nenhum vestígio desta cerimónia secreta em solo inglês, contudo não há dúvida que ela, estruturada como extensão de grau, já era admitida entre os autodenominados “Antigos”. Assim, pelo interesse que ela despertava na comunidade maçónica, a mesma não tardaria a se impor também entre os “Modernos”. Infelizmente ainda existem maçons na actualidade que “acham” que o Mestre Instalado é um grau maçónico – confundem, grau com cargo e título distintivo.
Diáconos – Outro ponto conflituante entre as duas Grandes Lojas era o de que os “Modernos” ignoravam a existência dos Diáconos.
Ressalte-se que os cargos de 1º e 2º Diáconos não são os do Diácono que aparecia em certas ocasiões nas corporações de pedreiros escocesas do século XVII. Como aqui já abordado, em algumas corporações de construtores da Idade Média o Diácono era o líder do canteiro e não um mensageiro ou mesmo um guia.
A bem da verdade, na Inglaterra os 1º e 2º Diáconos não são mencionados na primeira constituição dos “Modernos” (1723). Como guias e mensageiros eles devem o seu aparecimento na Inglaterra à Maçonaria Irlandesa, cuja qual, que desde 1733 já trazia esses cargos nas suas Lojas. Fala-se na presença dos Diáconos numa procissão maçónica trazendo às mãos uma vara, ou bastão. Em 1753, entre os “Antigos”, eles aparecem como oficiais inferiores da Loja, hierarquicamente logo abaixo dos Vigilantes.
Embora no princípio desconhecidos dos “Modernos”, pouco a pouco, os Diáconos ir-se-ão estabelecer nas suas Lojas, de tal modo que mesmo antes da união das duas Grandes Lojas rivais eles já são encontrados nas Lojas por volta de 1810, trazendo cada qual um bastão negro com uma jóia prateada no topo. Certamente As Três Batidas Distintas na Porta da Antiga Maçonaria, revelação atribuída aos “Antigos” que apareceu por volta de 1760, também colaborou para a fixação dos Diáconos entre as Lojas dos “Modernos”.
Cobridor Externo. Dentre os primeiros cargos que constituíram as Lojas maçónicas especulativas do século XVIII, encontra-se o cargo do Tyler, ou o Telhador, que ficaria também conhecido por Guarda Externo.
Na Moderna Maçonaria, nascida em 24 Junho de 1717 com a fundação da Premier Grand Lodge, o cargo de Telhador (Guarda Externo) nela aparece inicialmente como uma dignidade que posteriormente adaptou-se para ser um guarda nas Lojas, não obstante ele ainda possuísse outras obrigações de ofício, como as de ser o responsável pelo envio pessoal de convocações aos Irmãos e ainda traçar o Quadro da Loja quando da preparação do recinto para os trabalhos maçónicos.
Paulatinamente o cargo de Tyler (Telhador ou Cobridor Externo) foi se fixando nas Lojas inglesas. Em 1813, após a união entre duas Grandes Lojas rivais que resultou no aparecimento da Grande Loja Unida da Inglaterra, aparece, ao lado do Tyler, mais um Cobridor, porém este agora pelo lado interior do recinto e que ficou conhecido como Guarda Interno ou o Inner Guard (guarda do interior).
Deste modo, após a União de 1813 é inegável que boa parcela dos principais cargos da Loja foi emprestada dos “Antigos” e logo adaptada nos trabalhos do Craft. Esta principal estrutura fundamenta-se sobre os cargos de Venerável Mestre ou Mestre da Loja, Vigilantes ou Wardens, Tesoureiro, Secretário, Diáconos (ancestrais mensageiros oficiais de chão) e Cobridores.
Não menos importantes, outros cargos também aparecem nas cerimónias que são demonstradas após 1813, especialmente a partir de 1823 pela Emulation Lodge of Improvement. Incluem-se nos Trabalhos do Craft, ainda os cargos de Director de Cerimónias, Capelão, Esmoler, Director de Caridades, Organista e alguns assistentes de cargos quando necessários.
Moderna Maçonaria Francesa – No que diz respeito aos cargos em Loja na vertente francesa de Maçonaria, compete de antemão esclarecer que a sua Maçonaria Especulativa, ou dos Aceitos, floresceu em meados do século XVIII.
A sua estrutura de cargos foi em grande parte baseada na Maçonaria inglesa, sobretudo os cargos de Venerável Mestre, Vigilantes, Cobridores, Tesoureiro, Secretário e Diáconos, não obstante possa existir de acordo com o rito substanciais diferenças na execução dos seus trabalhos ritualísticos. Neste sentido poder-se-ia citar, por exemplo, o REAA (rito de origem francesa) onde os Diáconos, diferente do costume inglês, actuam exclusivamente como mensageiros e não portam bastão ou varas (canas).
Visando facilitar a compreensão desse tema, vale a pena antes expor um breve relato sobre a história da Maçonaria Francesa em meados do século XVIII.
Nessa época havia em solo francês dois ramos de Maçonaria a saber: um “stuartista”, alusivo ao escocesismo (movimento político que nascera no norte da França para a retomada do trono inglês), livre e que não se sujeitava a nenhuma obediência, e o outro, dependente da Primeira Grande Loja inglesa conhecida como os “Modernos” de 1717.
Ressalte-se que à época a França desconhecia por completo a prática dos autodenominados “Antigos” ingleses de 1751. Deste modo, se consolidava em solo francês a divisão entre as Lojas derivadas do “stuartismo” (com maior número) e as submissas aos ingleses da Premier Grand Lodge, essa com número substancialmente inferior.
Com o avanço das Lojas “stuartistas” que aumentavam progressivamente em número – provavelmente frenesi causado pelos altos graus – pleiteou-se em 1735 da necessidade de se eleger um Grão-Mestre para toda a Maçonaria Francesa.
Assim em 24 de Junho de 1738, Dia de São João Batista, numa assembleia geral é conferido ao Duque D’Antain o título de “Grão-Mestre Geral e Perpétuo dos Maçons do Reino da França”.
Com isto era então plantado o germe de uma Grande Loja em solo francês que seria denominada Grande Loja da França. Destaque-se que esta Grande Loja somente viria aparecer oficialmente vinte e sete anos depois, em 1765.
Comentários à parte, este acontecimento libertava definitivamente a Maçonaria Francesa dos grilhões da Maçonaria Inglesa, o que obviamente descontentou sobremaneira o egocentrismo inglês que, já naquela época, se auto intitulava o “Vaticano da Maçonaria” – vide o registo desse descontentamento inglês em anotação da segunda Constituição de Anderson, a de 1738.
Com a morte do Duque D’Antain em 1743, assume o grão-mestrado na França o Conde de Clermont – Louis de Bourbon Condé.
A gestão do sucessor D’Antain caracterizou-se pelo desinteresse pela Ordem, razão pela qual Clermont acabou nomeando prepostos para o seu lugar. Com cada preposto exercendo a totalidade do seu poder, sobretudo pelas as oposições que entre si provocavam, o resultado foi o do fraccionamento da Grande Loja.
Desafortunadamente esta atitude trouxe graves consequências para a Maçonaria Francesa, a tal ponto de ter vários dos seus maçons expulsos e ainda ter as suas reuniões proibidas pela autoridade real até 1771.
Com a morte do Conde de Clermont em 1771, e com o aval do Duque de Luxemburgo, assume o grão-mestrado francês o Duque de Chartres, que era primo do Rei da França.
Chartres, tal como Clermont, também não se interessava muito pelas coisas da Ordem, contudo, ao contrário de nomear prepostos, deixou a administração da Grande Loja para Duque de Luxemburgo. Na verdade, a intenção era a de reintegrar muitos dos maçons expulsos pela crise anteriormente deflagrada, bem como aproveitar o prestígio do Duque de Chartres, por ser primo do rei, para reerguer a então combalida Maçonaria Francesa.
Desta forma, em Agosto de 1771 inicia-se uma reforma administrativa na Maçonaria Francesa. Para tal é criada uma comissão composta por maçons reintegrados às fileiras da Ordem e por membros do Conselho dos Imperadores do Oriente e do Ocidente (escocesismo). O objectivo dessa comissão era promover uma extensa reforma administrativa elaborando estatutos e reorganizando os altos graus que surgiam de maneira descontrolada em solo francês. Desse modo, em 24 de Dezembro daquele ano, em assembleia administrativa era declarada extinta a Grande Loja da França.
No ano seguinte, em 1772, essa mesma comissão criava uma nova Obediência que seria nominada por Grande Loja Nacional da França, contudo, em 22 de Outubro daquele mesmo ano, a Grande Loja reúne-se em assembleia geral e adopta o nome de Grande Oriente da França.
Objecto desta reforma, o Grande Oriente da França traz consigo uma grande inovação administrativa introduzindo na França a chamada “democracia maçónica”, baseada num Poder Central assessorado por um grupo de deputados de todas as suas Lojas. A partir daí essa tem sido uma característica de todos os Grandes Orientes espalhados pelos países.
E assim segue a história da Maçonaria Francesa onde o Grande Oriente da França, no trajecto da sua existência, passará ainda por muitos acontecimentos relevantes, a exemplo do da Revolução Francesa no ano de 1789 onde actuaram maçons nos dois lados da contenda. Também não há como esquecer o ano de 1877 quando o Grande Oriente se coloca em contraposição ao teísmo em respeito à liberdade de consciência dos homens.
Assim se conclui este breve relato histórico pertinente à Maçonaria Francesa no século XVIII e início do XIX.
Ritos Franceses – É neste contexto histórico da Maçonaria Francesa que no século XVIII e início do XIX aparecem e se consolidam os seus principais ritos.
Dos seus primórdios pode-se citar: o Rito Francês, ou Moderno – criado em 1761, constituído em Dezembro de 1772 e proclamado pelo Grande Oriente da França em 9 de Março de 1773; o Rito Adonhiramita – surgido com a publicação na França, em 1744 da primeira edição, e logo a seguir a segunda edição em 1747 do Catecismo dos Franco-Maçons, ou O Segredo dos Franco-Maçons; o REAA, cujo primeiro ritual simbólico somente apareceria em 1804 e posteriormente publicado em 1821 no Guia dos Maçons Escoceses.
Cada rito que se consolidava em França trazia, além das características maçónicas universais, também as suas próprias particularidades litúrgicas, ritualísticas e de distribuição de cargos. Em síntese, cada qual trazendo o seu próprio ritual e o seu particular modus operandi de trabalho.
Embora a existência destas diferenças, todos os ritos sempre trabalham em prol de um mesmo objectivo – o do aprimoramento humano.
Cabe salientar que não só entre as duas principais vertentes maçónicas, mas também entre ritos da mesma origem, alguns cargos podem existir, enquanto noutros não.
No que diz respeito aos cargos universais, isto é, os comuns em qualquer vertente, trabalho ou rito, encontramos o de Venerável Mestre (ou Mestre da Loja), Vigilantes (ou Wardens), Diáconos (em alguns casos), Cobridores, Secretário e Tesoureiro.
Além destes cargos, tidos como universais, os ritos de origem francesa também trazem os de Orador (fiscal da lei), Mestre de Cerimónias (exerce actividade diferente da do Director de Cerimónias inglês), Expertos, Chanceler, Hospitaleiro e, dependendo do rito, ainda outros como o de Mestre de Harmonia, Porta-Espada, Bibliotecário, Mestre de Banquetes, Arquitecto, etc. Reitera-se que na Maçonaria Francesa os cargos de Loja só se constituíram nos séculos XVIII e XIX com a profusão dos ritos e o aperfeiçoamento dos seus rituais.
Ainda uma das características dos ritos de origem francesa é a de classificar os seus cargos principais como Luzes da Loja (em número de três), Dignidades da Loja (em número de cinco) e os Oficiais – esses últimos em quantidade conforme o rito.
Nesta classificação, o Venerável Mestre e os dois Vigilantes são as três Luzes da Loja. Estas então somadas ao Orador e ao Secretário perfazem as cinco Dignidades. Além das Luzes e Dignidades são necessários pelo menos mais dois Mestres Maçons ocupando cargos para abrir a Loja (três governam a Loja, cinco a compõem e sete a completam). A Moderna Maçonaria exige o mínimo de sete Mestres Maçons para se abrir uma Loja, destacando que dentre eles o Cobridor Interno sempre se faça presente.
Já a vertente inglesa trata o Mestre da Loja (Venerável) e os Wardens (Vigilantes) como Principais Oficiais (3). Ainda o Cobridor Interno e os Diáconos como Oficiais Ajudantes (3), mais o Tyler (Cobridor Externo). Outros cargos se distribuem conforme o working (Secretário, Tesoureiro, Capelão, Esmoler, Mestre de Caridade, Director de Cerimónias, Organista). A estrutura de cargos de Loja da Moderna Maçonaria Inglesa se consolidaria após o Acto de União de 1813.
É também um dos apanágios da vertente inglesa possuir uma cerimónia de Instalação para conduzir o Mestre da Loja ao trono. Quando o Mestre da Loja deixa o cargo por ter cumprido o mandato ele é o Imediate Past Master, depois disso é o Past Master.
Indevidamente este costume – original da Maçonaria Inglesa – acabou parando nos ritos da vertente francesa de algumas Obediências espalhadas pelo mundo. Originalmente, na França não existe cerimónia de Instalação e nem a figura do Mestre Instalado. O Venerável ao deixar o cargo é o Ex-Venerável mais recente e, posteriormente, o Ex-Venerável.
É bem verdade que nos meados do século XX uma Obediência francesa (lá existem três), provavelmente para agradar e receber o reconhecimento inglês, adoptou inapropriadamente a Instalação até em ritos que não a possuem. Como consequência, este enxerto acabou espalhando-se por outras Obediências ao redor do Terra. É o caso do Brasil, por exemplo, onde o REAA, que é um rito de origem francesa, recebeu uma indevida cerimónia de Instalação. Mesmo enxertada, esta prática acabou tornando-se consuetudinária, sendo comum no Brasil tratar-se os Ex-Veneráveis como Mestres Instalados.
Por fim, eram estes os comentários a respeito do ancestral aparecimento dos cargos em loja na Moderna Maçonaria. Procurou-se tomar por base a Maçonaria primitiva da Escócia do século XVII, bem como na sequência a Moderna Maçonaria inglesa e francesa.
Em que pese os primeiros registos ritualísticos para dois graus se encontrarem datados de 1696 no Manuscrito dos Registos da Casa de Edimburgo (Edimburg Register Hause), na Escócia, não há dúvida que os ritos maçónicos se construíram proficuamente nos séculos XVIII e XIX para chegarem até aos nossos dias com as suas riquíssimas formas de trabalho exaradas pelos rituais autênticos.

Pedro Juk
Publicado na revista Freemason- Portugal



Bibliografia
  • DACHEZ, Roger e BAUDIGNON, Thierry. Cargos em Loja da Maçonaria e Dignidades Maçónicas na Grã-Bretanha do Século XVII até aos nossos dias. Tradução – José Filardo. Publicado no Blog o Ponto e o Círculo. 2021
    CARR, Harry. Seiscentos Anos de Rituais. Conferência. Tradução Paulo Daniel Monteiro.
    CARR, Harry. O Ofício do Maçom, Editora Madras, São Paulo.
    CASTELLANI, José. A Maçonaria Moderna. A Gazeta Maçónica. 1987
    JONES, Bernard E. Freemason’ Guide and Compendium. George G. Harrap & Ltd. London. 1950
Pedro Juk- Revista Freemason-Portugal
Enviado por João Anatalino em 16/06/2021


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