A CABALA E A FÍSICA QUÂNTICA- A QUESTÃO DA EXISTÊNCIA DE DEUS
Para os cientistas, o início do tempo coincide com o nascimento do universo conhecido, momento esse chamado de Big Bang. Assim, o tempo teria começado a existir junto com o espaço, razão pela qual essas variáveis sempre são representadas por dois vetores em forma de L, cujas linhas começam em um ponto zero e se alongam na mesma proporção. Mas antes de o universo ter nascido, o tempo ter começado e o espaço começar a ser preenchido, o que havia? Essa é uma pergunta que nenhum cientista ousa afirmar que sabe a resposta. Eles só dizem que uma forma extremamente poderosa de energia provocou a grande explosão que deu origem ao universo. E é claro. A lógica confirma essa especulação. Não existe consequência sem causa, e o universo, se ele um dia saiu da explosão de um campo de energia, então é porque antes dessa explosão, essa energia já existia.
Esse campo de energia é a causa de existência do universo. É lógico também especular que tudo que existe, existiu e existirá no universo já estava presente nesse “quanta” de energia que um dia explodiu. Jorge Luiz Borges, em seu conto cabalístico “O Aleph” faz um interessante retrato desse átomo inicial. Daí o fato de vários estudiosos da física quântica verem na descrição que a Cabala faz do nascimento do universo, muitos paralelos que aproximam os dois campos de conhecimento.
Passando para o terreno da religião, encontraremos na Bíblia uma interessante descrição desse fato. Mas os cronistas bíblicos, ao registrá-lo, não foram menos metafóricos e misteriosos do que os cientistas que procuram explicar como o universo nasceu. A Bíblia fala que “no início Deus criou o céu e a terra. Que a terra estava informe e vazia e as trevas cobriam a face do abismo.” E então, do meio às trevas Deus fez sair a luz. E Ele viu que a luz era boa e por isso a separou das trevas. E com a luz Ele fez toda a realidade existente. A descrição é metafórica, mas se quisermos aproveitá-la para fazer uma boa especulação, podemos dizer que foi mais ou menos isso o que Einstein também intuiu e registrou com a sua equação E=mc2. Curiosamente Einstein também era judeu.
Segundo os historiadores Finkelstein e Ascher (A Biblia Não Tinha Razão- Ed. Girafa, 2003) a Bíblia foi escrita por rabinos judeus contratados por um rei chamado Josias, que reinou em Israel no século sexto antes de Cristo. Sua intenção foi dar aos israelitas uma história que justificasse a sua pretensão de povo escolhido por Deus e os direitos que eles reivindicavam sobre as terras palestinas.
Se foi isso mesmo que aconteceu não dá para saber com certeza. Tem lógica se levarmos para o lado político, mas não explica a extraordinária repercussão que esse livro alcançou no mundo, tanto que até hoje ainda é o mais acreditado pela maioria das pessoas, inclusive contra a opinião de muitos cientistas. E não são todos os cientistas que desprezam a Bíblia como fonte de boa informação sobre as origens do universo. Existe um grupo de estudiosos da física quântica e da astronomia, que veem nas crônicas bíblicas interessantes paralelos com as descobertas feita pela ciência.
Especialmente no que dizem os cabalistas, grupo de rabinos judeus que interpretam a Bíblia de uma forma metafórica e mística, desenvolvendo em estranhas imagens e numa linguagem ininteligível para os não iniciados nos mistérios da língua hebraica, alguns conceitos que muito se assemelham aos usados na física quântica.
Nesse sentido, poder-se-ia dizer que, materialmente, Deus nasceu junto com o universo, e em termos de tempo real, ele teria a mesma idade que o mundo físico ostenta. Por isso a Cabala o chama de "Ancião dos Dias" da mesma forma que chama o universo por ele criado de o "O Grande Rosto". Mas em termos de realidade potencial, temos que admitir que Ele já existia antes de o universo ter nascido, pois foi Ele quem o fez.
A Bíblia identifica Deus como o "Espírito que se movia sobre as águas." Uma expressão enigmática que nunca pode ser explicada a contento dentro da lógica comum, pois se o mundo ainda era apenas trevas e a terra era informe e vazia, que “águas” eram essas sobre as quais o Espírito de Deus se movia? Pois, ao que parece, elas já existiam antes de Deus separar a luz das trevas. Stephen Hawking (Uma Breve História do Tempo, 1989), escreve que no início do universo, quer dizer, no momento seguinte à explosão do campo energético que lhe deu origem, um "oceano" de quarks e antiquarks se formou, dando origem à várias partículas atômicas chamadas de prótons, nêutrons, mésons e bárions, de cuja união saíram os núcleos de hidrogênio, hélio, lítio e deutério que estão na origem da massa física do universo. Esses elementos, segundo esse grande cientista, (considerado por muitos colegas um novo Einstein), estão na origem dos primeiros átomos. Portanto, assim nasceu o universo real: a partir de "um mar primordial" de energias dispersas, originadas da explosão de um centro único de infinita potência radioativa. As descrições, bíblica e científica, aqui combinam.
Por seu lado, a Bíblia nos dá uma ideia do que era Deus antes de começar o mundo: Ele era um Espírito. Ele se movia sobre as "águas primordiais". Se ousarmos colocar essa metáfora dentro das especulações de Hawking, poderíamos imaginar Deus como a "Mente", ou a "Mão", que organizou essas energias dispersas, concentrando-a em pequenos grãos chamados átomos, que seriam as "sementes" das quais sairia o universo. Destarte, à Mente de Deus poderíamos chamar de relatividade e à sua Mão daríamos o nome de gravidade, pois se uma promove a expansão do universo e o seu preenchimento com matéria (E=mc²) , a outra organiza todo esse caos, ajuntando a matéria produzida em sistemas funcionais (galáxias, sistemas planetários, biomas, organismos etc.)
Mas uma pergunta fica ainda sem resposta: O que Deus fazia antes de começar o mundo? Essas especulações são tão intrigantes que os produtores e comentadores da Bíblia, tiveram que quebrar a cabeça para responder à multiplicidade de questões que surgiram a esse respeito. Por isso, um grupo de inspirados rabinos desenvolveram a tradição da Cabala no início do século II da era cristã. As especulações desses sábios, juntamente com outras geradas pelos filósofos neoplâtonicos, tornaram-se, com o tempo, uma escola de interpretação da Bíblia, a Halakha. A Cabala, além de interpretar o Livro Sagrado de uma forma esotérica, mágica, desenvolveu uma forma de linguagem, criada especificamente para explicar as escrituras sagradas, que, no entender desses estudiosos, foram redigidas numa espécie de código só inteligível para alguns iniciados, mas bem parecida com linguagem usada pelos cientistas da física quântica.
Para responder á intrigante pergunta de quem era Deus e o que fazia antes de começar a fazer o universo físico, os cabalistas criaram o conceito de “Existência Negativa” e “Existência Positiva”, termos que designam Deus “antes” e “depois” de fazer o mundo. Nesse sistema, Deus (Ain), é visto como uma forma de "energia" que em dado momento manifestou-se no mundo real, tornando-se o “átomo primordial” (Ain Sof ), cujo nucleo se rompe por força da própria pressão da energia concentrada dentro dele. Com a explosão, essa energia torna-se Ain Sof Aur, ou seja, a Luz Ilimitada, que preenche o espaço vazio.
Essa visão mística do nascimento do universo é definida no Sepher Há Zhoar, o livro básico da Cabala, com a curiosa metáfora que diz: “antes que o equilíbrio de consolidasse, o semblante não tinha semblante”. Aqui está inserta a estranha ideia de que antes de fazer o mundo, ou seja, antes de o Espírito de Deus manifestar-se como existência física, Ele já existia como uma forma de energia, que embora não manifesta, continha em si mesma todos os atributos do universo manifestado. Inclusive as próprias "águas" em que ele se movia, que pode ser entendida como a substância radioativa da qual Ele viria, mais tarde, a gestar a vida. Ao manifestar a sua potência através da grande explosão do Big Bang, Ele criou para si mesmo uma “existência positiva”, ou seja, um segundo polo pela qual a sua energia pode se espalhar e criar as realidades universais.
Antes de fazer o universo (ou seja, antes do Big Bang), Deus vivia uma “existência negativa”, na qual a mente humana não pode penetrar justamente porque ela só pode conceber um plano de existência positiva, onde as ações podem ser identificadas e suas causas recenseadas. Por isso a não menos curiosa ideia de que, para haver criação, é preciso a existência de duas forças contrárias, dois polos de ação energética que atuem em sentidos contrários, mas convergentes, chamadas de Yin e Yang pelos taoístas. Positivo e negativo. Macho e fêmea. Ou, no caso, matéria e espírito. Ou seja, o movimento dialético que dá vida ao universo.
A pergunta que surge dessas especulações é: será que Deus, que vivia uma Existência Negativa, resolveu fazer o universo para ter uma Existência Positiva e assim poder criar? Essa é uma das razões do porquê os cabalistas cristãos definirem Deus (e sua manifestação humana na pessoa de Jesus) como o Verbo que se fez carne e habitou entre nós. (No início era o Verbo, o Verbo estava com Deus, e um Deus era o Verbo) – João, 1:1.2, e os cronistas bíblicos definirem o nome de Deus como "Eu Sou".
De fato, essa ideia da divindade, desenvolvida pela Cabala, supre a necessidade que a mente humana tem de situar um início para o universo e imaginar, não um fim para ele, mas uma finalidade. Deus, o Espírito, ao fazer o universo, fez para si mesmo um corpo material. Sem esse corpo Ele não teria como criar. Como fez depois, para o homem Adão, uma fêmea (outra metáfora para a qual a Cabala tem uma explicação bastante criativa). Sem ele não haveria criação e a humanidade não existiria. Dessa forma tudo se encaixa, e nós podemos concluir: o universo é o corpo material de Deus. Por isso ele é feminino e masculino ao mesmo tempo. Ele é a natureza, mãe e pai das Cem Famílias, ou seja, a humanidade, como dizem os taoístas, e também como creem os panteístas, que identificam Deus como sendo a própria natureza criadora. Por consequência, quando maltratamos a natureza estamos maltratando o próprio corpo de Deus.
É nesse e em outros sentidos que muitos estudiosos estão enxergando uma aproximação entre as descobertas da física quântica e as estranhas visões da Cabala. Os paralelos são muitos e as visões que as apontam merecem a devida consideração. .
