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INTRODUÇÃO Á CABALA FILOSÓFICA

 

LIVRO: MAÇONARIA - A CABALA DO OCIDENTE- INTRODUÇÃO Á CABALA FILOSOFICA

AUTOR: JOÃO ANATALINO RODRIGUES

EDITORA MADRAS, SÃO PAULO, 2024-23º BIENAL DO LIVRO

                                           

                 

Esse livro é um estudo sobre as inspirações que os mestres cabalistas que escreveram o Sefer Há Zhoar tiveram com a leitura e interpretação dos chamados mistérios contidos na Bíblia e sua conexão com práticas espiritualistas modernas, como a Maçonaria e o Espiritismo. Não é, como se percebe ao longo dos textos aqui elencados, uma incursão mais profunda nesse volumoso repertório de metáforas e visões que as mentes privilegiadas dos místicos rabinos de Israel elaboraram com essa finalidade, mas sim um conjunto de intuições particulares que o autor teve ao ler o Zhoar e os comentários que dele fizeram os diversos autores que se debruçaram sobre esse inspirado poema gnóstico.

O Zhoar, como sabem os estudantes dessa maravilhosa doutrina que convencionou-se chamar de Cabalá, é um livro que interpreta a Bíblia de uma forma mística e transcendente, fugindo das exegeses tradicionais, lógicas e conservadoras que são feitas desse formidável legado que os sábios de Israel proporcionaram à humanidade. Nele, toda a ação de Deus na construção do universo é mostrada na forma de metáforas, imagens, visões e alegorias que uma mente treinada na racionalidade da vida diária tem dificuldade para entender, mas para quem tem sensibilidade para perceber a grandiosidade da Obra do Criador, ela parece simples e natural, como a leitura de um poema de Dante, uma estória das Mil e Uma Noites ou um conto de Jorge Luiz Borges.

É que a grande maioria dos ocidentais não está acostumada com a forma de pensar dos povos orientais. Nesta predomina o uso indiscriminado de imagens e metáforas, próprio dos sistemas de escrita desses povos. Esses sistemas são baseados em ideogramas, que são sinais gráficos representando imagens, ao invés de caracteres formando palavras e números, com os quais expressamos a nossa visão do mundo. No entanto, se pensarmos bem, é muito mais fácil treinarmos nossa mente para ler e entender ideogramas do que letras. A prova disso está nas rodovias, nos aeroportos e outros lugares de grande tráfego de pessoas, onde se utilizam placas de orientação com imagens ao invés de palavras. Qualquer pessoa, mesmo sendo iletrada, consegue entendê-las, não importando a sua nacionalidade ou idioma, porque os símbolos são universais.

Como diziam os chineses, um quadro fala mais que mil palavras. O Sefer há Zhoar foi escrito para a imaginação do leitor e não para sua mente lógica.  É uma verdadeira Gestalt, no sentido de que as imagens que se formam na mente do leitor não podem ser decompostas em partes, mas só se consegue entendê-las na sua integralidade, e mesmo assim, quando elas se formam, logo percebemos que foram acrescidas pela nossa própria imaginação.

É que o universo, como mostram hoje as modernas teorias que estudam a sua composição mais íntima, na sua estrutura e finalidade não se apresenta como um sistema linear, mas sim como uma formulação que contém inúmeras variáveis que se integram para formatar a realidade. Por isso tantas lendas e mistérios envolvem a sua composição, e mais ainda, a sua origem.

O Zhoar é uma aventura onírica pelo universo da espiritualidade, feita pelos sábios de Israel, com a intenção de conectarem-se com o Pensamento do Criador. Ninguém pode provar onde, quando e por quem ele foi escrito. O que se sabe, com certa dose de certeza, é que ele foi compilado e revisado por diversos autores que certamente devem ter-lhe acrescentado as suas próprias visões pessoais. Isso acontece com todos os grandes livros que tratam do tema da espiritualidade. O que é certo, e pode ser sentido na leitura do Zhoar, é que seus revisores e comentadores conseguiram fazer com que esse livro nos desse uma impressão de antiguidade e modernidade ao mesmo tempo. A antiguidade é posta no sentido de que ele reflete ideias, conceitos e sensibilidades que podem ser recenseadas no tempo como contemporâneas das mais vetustas intuições humanas. Assim podem ser entendidas a proposição da existência de um Princípio Luminoso na origem do universo, que os mestres cabalistas chamam de Ain Soph Aur- A Luz Infinita, e os conceitos de reencarnação e destino, conhecidos como Gilgou e Carma, respectivamente, que são apresentados como estratégias da divindade para colocar ordem e sentido no processo de evolução da vida.

A modernidade do Zhoar é dada pela estranha conexão que as visões cabalistas parecem ter com temas que estão sendo tratados nos artigos publicados sobre física quântica e neurociência em livros e revistas da atualidade. Nestas, a intuição de um pampsiquismo existente entre o fenômeno humano e o processo de estruturação do universo enquanto materialidade manifesta, parece ser uma realidade que a cada dia mais se afirma. A prova disso é a constatação, feita por inúmeros cientistas, da impossibilidade de separar a consciência humana do conjunto das realidades cósmicas, pois ela é um componente indispensável ao processo que faz o universo existir. Há vários exemplos desse conceito no decorrer deste trabalho e a tradição cabalista, com suas visões de Mundos Superiores e Mundos Inferiores, o diagrama da Árvore da Vida e os conceitos sobre carma, reencarnação e outras modalidades sutis de constituição do universo físico e do mundo espiritual, nos oferece uma interessante antecipação das descobertas que a física quântica e as pesquisas astronômicas nos estão oferecendo agora. Essas constatações têm sido feitas por vários cientistas de renome, e são informadas no decorrer deste trabalho.

 

A própria construção da realidade universal, a partir de um sistema ordenado de evolução e continuidade que explica a origem da matéria e a função do bem e do mal, (presentes no diagrama da Árvore da Vida), tem na Cabalá um dos seus mais interessantes ensinamentos. E o papel do povo e da nação de Israel nesse processo, expresso no engenhoso conceito da Tikum Olam, explica a estranha experiência desse extraordinário povo, que parece simbolizar em sua história a própria saga da humanidade na sua procura por uma identidade e uma função no universo da vida.

O livro mostra também que na doutrina da Cabalá há uma sensível semelhança com os conceitos do Taoísmo, especialmente em relação ao papel da polaridade positivo/negativo, que nessa antiga filosofia chinesa atua como forma de equilíbrio cósmico. Na Cabalá, há uma formulação equivalente no conceito de Existência Negativa e Existência Positiva que o Criador assume na sua proatividade criadora. Verificamos também que a doutrina da Cabalá se aproxima bastante das concepções maniqueístas que o pensamento religioso ocidental desenvolveu com suas metáforas de luta eterna entre bem e mal, luz e trevas, positivo e negativo, certo e errado, Deus e o Diabo etc., mas a sua conclusão leva a um diferente caminho filosófico que o pensamento ocidental não logrou desenvolver.

É que no espírito do homem ocidental esse eterno embate o encaminha para um sentido de querer livrar-se do mal para poder gozar o bem. Mas na Cabalá, como no Taoísmo, isso é impossível, pois ambos fazem parte de um mesmo sistema, destinado a manter o equilíbrio universal; de forma que a simples eliminação de um implicaria na supressão do outro, e assim desapareceria a própria energia que sustenta a vida do universo.

A Cabalá ensina que o único mal que existe no mundo é o nosso próprio Ego, com o seu ardente e insaciável Desejo de Receber tudo o que a Luz Infinita do Criador pode proporcionar. Mas nesse Desejo também reside o bem, porque o Ego, igualmente, hospeda o Desejo de Compartilhar, que se resume, no mundo físico, especialmente na socialização e na procriação, mas também inclui as demais virtudes do ser humano, como a bondade, a caridade, a piedade, a compassividade, a tolerância, o amor etc., que são arquétipos de um mundo ideal, como pensava Platão e seus seguidores, e que, na Cabalá são vistos como atributos do Criador.  É no equilíbrio entre essas duas forças – Receber e Compartilhar que estão a felicidade, a paz, o sucesso, o prazer e todas as sensibilidades que o homem busca na vida, sensibilidades essas que o autor  define pela palavra processual “felicidade”, que  no livro é vista como plenitude espiritual.

 

A ótica cabalista a respeito dos nossos processos mentais pode parecer um tanto chocante e irreal para a mentalidade do homem ocidental, criado para ter uma visão positivista do mundo. Para estes, a conclusão pode até ser frustrante porquanto ela parece afastar a ideia de um progresso fundamentado no ter para construir um ser. 

Porém, quando analisada mais a fundo essa doutrina, verifica-se que essa é uma intuição equivocada. É que, para a Cabalá, a plenitude que nós chamamos de felicidade é realizada sem o estresse de querer obter prazer sem dor, riqueza sem experimentar carência, saúde sem doença, vitórias sem derrotas etc. Trata-se de uma visão integradora do fenômeno da vida, no qual se justifica a existência do mal como polaridade necessária para a existência do bem e vice-versa, pois é na balança entre os dois conceitos que ela mesma se equilibra.

Na mente ocidental esse é o grande objetivo de nossas vidas: o ganho sem perda, ou com o menor dispêndio possível. No sistema cabalístico isso é impossível, pois como veremos, o equilíbrio universal só se atinge na equivalência das forças que atuam na composição do processo.

Como podemos perceber, cada vez com mais clareza, o nosso extraordinário desenvolvimento tecnológico parece nos encaminhar para um sentido oposto àquele que todo esse esforço deveria nos levar. Para produzir toda essa “riqueza” tecnológica da qual nos ufanamos, nós acabamos interferindo no sistema de relações que rege a vida do universo e por isso estamos pagando muito caro. Cataclismos naturais, guerras, conflitos pessoais, desagregação social e familiar, estresse e perda do sentido da vida são as consequências desse processo.

Como sustenta a doutrina cabalista, a visão linear do tempo e da história está nos conduzindo para uma direção bem diferente daquela que gostaríamos de ir. Quanto mais tentamos dominar a natureza, mais ela nos foge e se vinga da nossa tirania. Por isso, o praticante da Cabalá pergunta a si mesmo o que pode ser encontrado e revelado no universo ao invés do que existe para ser conquistado e usufruído nele. É, pois, uma visão integralista, no sentido de incorporar ao estofo do universo, que é formado pela Energia emitida pelo Criador, à nossa própria emissão energética, na forma de atividade cerebral, psíquica, que, ao nosso ver, nada mais é do que o fenômeno que nós chamamos de espírito.

Por isso é que o leitor espiritualista encontrará nas visões cabalístas muito mais vínculos com a sua crença, seja ela qual for, do que em qualquer outra doutrina. Este trabalho tem também esse objetivo: mostrar que a realidade espiritual não é um delírio metafísico que é próprio de pessoas extremamente sensitivas, mas sim um fenômeno natural que se insere nas propriedades da Energia que está no estofo do universo. E que ele está ligado umbilicalmente à consciência humana, sendo ela o resultado da atuação dessa Energia, concentrada sobre o fenômeno da vida.

A doutrina cabalista não é, como de início se poderia pensar, um libelo contra as conquistas tecnológicas, a busca do prazer e a consequente anulação da dor. Ela é, mais que tudo, uma doutrina que ensina a combinar os dois polos da Energia que está na origem da realidade universal para obter um equilíbrio que nos permita a fruição da plenitude física e espiritual, que é o objetivo da vida. É nesse sentido que ela integra, não só as intuições taoístas sobre o equilíbrio entre yang e yin, como medida de integração total do espirito do homem com a natureza, mas também as recentes descobertas da neurociência, especialmente as que estão presentes nas técnicas da PNL (Programação Neuro Linguística) e os ensinamentos obtidos com as descobertas da física quântica.

São nessas estratégias que podemos sentir a modernidade das concepções cabalísticas quando fazemos um paralelo dessas visões com recentes publicações científicas que mostram a intimidade dos processos que dão origem à matéria universal, estudados pela física quântica e pela astronomia, integrando também as recentes descobertas da ciência genética que estuda a origem da vida e seus processos de desenvolvimento e adaptação ao ambiente.

Como a grande maioria dos livros “inspirados” por revelação divina, as visões do Zhoar não são de fácil absorção pela mente do homem moderno, que prima pela logicidade das suas concepções. O Zhoar é, antes de tudo, um produto do inconsciente coletivo de um povo que viveu uma saga extraordinária de ascensões e quedas e foi formado no ideal de uma utopia que nunca se realiza, mas que também não pode ser descartada como esperança a ser concretizada. Porque os seus elaboradores acreditam ser esse o próprio objetivo da Divindade que criou o universo como projeção de Si mesma, com a intenção de compartilhar a sua Potência, que se resume, afinal, em um ilimitado Amor.

O Zhoar é um livro de revelações (tanto quanto o Apocalipse cristão, os escritos proféticos da Bíblia, as visões extraordinárias dos místicos orientais em seus poemas épicos), que usam a magia aliciadora da linguagem visionária para comunicar as suas intuições. E como vários outros livros de inspiração mágica, é um produto da fértil mentalidade oriental, cujas crenças nunca se despregaram da ideia de que o sobrenatural está na origem de tudo, e que esse tudo se conforma em um propósito que só a Mente Divina conhece.

No fundo, o que o Zhoar revela nada mais é do que o ego transcendental do homem. É, como diz Jung em seus trabalhos sobre os conteúdos desconhecidos da nossa mente, uma viagem pelo inconsciente coletivo da humanidade em busca de uma integração com a sua origem luminosa. Porque toda a estrutura do sistema cabalístico tem como finalidade última e precípua a defesa de uma ideia que tem sido proposta explicitamente por outros sistemas de pensamento místico, pelas mais variadas religiões e até por pensadores racionalistas e modernos ensaístas: a de que tudo, no universo, tem como base um fenômeno luminoso, seja ele oriundo de uma Divindade, de uma fonte de energia desconhecida, ou até mesmo de um corpo celeste como o sol, como pensavam os praticantes das religiões solares da antiguidade.

A novidade do Zhoar é a sua compatibilidade entre as visões místicas dos sábios da antiguidade e as modernas descobertas da física quântica, juntamente com as especulações de pensadores e ensaístas modernos como Teilhard de Chardin, Carl Gustav Jung, Stephen Hawking, Fritjof Kapra, Deepak Chopra e outros, cujos trabalhos têm procurado encontrar o elo perdido entre o homem e a sua origem cósmica.

Destarte, em suas especulações o autor julga também encontrar muitos paralelos com estruturas de pensamento mais recentemente desenvolvidas, como a Gestalt terapia e as técnicas da chamada Programação Neurolinguística. Esses paralelos serão expostos neste trabalho e estão sujeitos ao crivo crítico dos leitores tanto quanto todas as demais especulações que já foram feitas e publicadas sobre o assunto.

 

É um trabalho desenvolvido especificamente para maçons, já que o autor entende que a prática da Maçonaria tem uma inspiração muito forte na doutrina cabalística. Por isso é que ele chama a Maçonaria de Cabalá do Ocidente, pois nela encontraremos o essencial dessa tradição, associada à outras doutrinas espiritualistas, como a gnose, o hermetismo, o espiritismo e conceitos desenvolvidos pelos filósofos neoplatônicos. Mas todos os leitores com interesse no moderno espiritualismo que tem ganho tantos adeptos atualmente, graças principalmente às descobertas da ciência atômica, poderão encontrar nele uma leitura agradável e um cabedal de informações para reforçar a sua esperança de que, num futuro próximo, ciência, filosofia e espiritualidade andem juntas pelo mesmo caminho.

( introdução à obra Maçonaria- A Cabala do Ocidente)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 04/11/2024
Alterado em 04/11/2024


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